A MÍDIA NÃO INVENTA NOTÍCIAS. ELAS ACONTECEM
Não é agradável para o jornalista inserir manchetes sobre crimes, seqüestros e roubos. É muito triste que uma cidade de porte médio tenha tanta ocorrência policial e de proporções gravíssimas no seu cotidiano. Faz parte do jornalismo o convívio com as duas pontas da notícia. Um lado bom e um lado mau. Um jocoso ditado caipira diz que é “fácil falar das pingas que a gente bebe, mas não falam dos tombos que a gente leva”. Apesar de abstêmio, vejo no adágio como é fácil criticar jornalista. É criticado tanto pelos intelectualóides de direita como pela burrice dos da esquerda.
No início da carreira já ouvia preleções de um autoritário secretário de redação. Dizia coisas, que por intuição qualquer estagiário de comunicação já sabia. O homem era conciso e direto até para nortear o estilo da escrita. Vivia preocupado com a concisão. Ensinava o óbvio. “O texto deve ser enxuto, de frases curtas e na ordem direta”, proclamava. Vociferava para que se evitasse qualquer recurso que alongasse a frase, como vírgulas, conjunções e outras, principalmente mas e assim. Odiava verbos no gerúndio. O gerúndio era algo que o deixava possesso.
Alardeava o uso do velho, sábio, conhecido, mas nem sempre obedecido conceito de pirâmide invertida: quem, o que, quando, onde, como, por que. “Antes de escrever não esqueçam que essas seis perguntas são fundamentais” – proclamava do alto de sua sapiência. Era pródigo em minúcias. Por incrível que pareça – dizia ele de forma professoral – há quem se esqueça da regra comezinha de que o verbo deve concordar em gênero, número e grau com o sujeito. Explicava o óbvio, que quando houvesse oração subordinada com o mesmo sujeito, apenas o primeiro verbo flexionava. E dava exemplos ridículos – “nós nos reunimos para estudar. Só – o “reunimos” – vai para o plural – o “estudar” fica no singular”, alfinetava.
Hoje, vejo que esse esmero com a gramática e até as críticas vazias de conteúdo não nos preocupa tanto. Preocupante é o noticiário. Há mais notícias ruins a serem publicadas do que boas novas. A família está desestruturada e pregam-se novos valores. Vejo isso nas novelas. Aliás, não as vejo. Assisto só as chamadas. Essa inversão de valores é responsável pela maioria de notas que entristecem o jornalista, mas ele é obrigado a publicá-las. O jornal não inventa notícias, elas acontecem.
Alcindo Garcia é jornalista – e-mail: [email protected]