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A virtude está no meio e não nos extremos

Caio Augusto Silva dos Santos, presidente da OAB SP. Data: 03/07/2019 – Local: São Paulo/SP-Foto: José Luis da Conceição/OABSP

Enuncia o artigo 225 da Constituição Federal que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Do quanto acima enunciado, vê-se para logo que a obrigação de preservação do meio ambiente é ampla, geral e irrestrita, ou seja, é compromisso atribuído pela Constituição Federal não só ao Poder Público, mas igualmente à coletividade em decorrência da assertiva de que esta é a verdadeira destinatária da proteção em estudo.

Ora, não é possível falar-se em vida digna às presentes e futuras gerações se não houver equilíbrio entre o desenvolvimento e a preservação do meio ambiente, principalmente porque não se pode negar que a qualidade de vida pressupõe minimamente o cuidado com a busca de um desenvolvimento sustentável.

É que, não obstante o lucro encontre legitimação na lei e mesmo no ordenamento constitucional, jamais se poderá perder de vista que o seu campo de beneficiados sempre é infinitamente menor do que aquele alcançado quando da adoção de expedientes protetivos ao meio ambiente.

Na linha do sábio adágio de que a virtude está no meio e não nos extremos, também é preciso sopesar a necessidade de contemplação de um padrão de proteção à flora, à fauna e à biodiversidade que não emperre o desenvolvimento indispensável ao asseguramento de uma vida digna às pessoas.

Por assim ser, somente mediante o fomento de um círculo virtuoso que permita uma interação adequada entre as pessoas e a Natureza, é que se permitirá àquelas o acesso a bens que supram seus anseios dentre de uma razoabilidade coerente sem retirar desta o equilíbrio mantenedor das regras universais que garantiram até agora a sobrevivência humana.

Quer-se com isso dizer que, embora seja compreensível a lógica que deu ensejo ao surgimento do princípio do acesso equitativo aos recursos naturais a fazer-nos reconhecer que tais bens constituem-se em patrimônios da humanidade com simples regra de prioridade a quem está mais próximo na medida das suas necessidades – e, portanto, suscetível às pressões e defesas externas das nações e povos que já não mais têm o que preservar –, nunca se poderá descurar da premissa de que a soberania é conceito que há de ser defendido e exercido com robustez para o asseguramento do direito que cada nação e povo têm de usufruir com inteligência, razoabilidade e equilíbrio dos recursos naturais que lhes pertencem.

Não se tem dúvida de que jamais se poderá trilhar o equivocado caminho dos erros históricos cometidos por aqueles que relegaram a proteção ao meio ambiente a plano secundário quando do estabelecimento de políticas sem freios para a busca da impiedosa sanha desenvolvimentista de acesso ao lucro a todo custo.

Afinal de contas, o que verdadeiramente deve ser defendido em um Estado Democrático de Direito não é o fomento de abismos entre as pessoas que nele vivem mediante a concentração de renda nas mãos de uns poucos abastados que podem e querem valer-se da exploração desmesurada do “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” sem preocupação com a coletividade, mas sim e unicamente a estruturação de um sistema de desenvolvimento ecologicamente equilibrado que permita a todos, bem aventurados ou não do ponto de vista econômico, o acesso a uma vida digna.

O momento, portanto, é de colocarmo-nos todos como responsáveis pela equalização desse quebra-cabeça cuja peça principal nessa quadra nacional talvez seja vivenciar e cobrar cumprimento aos regramentos estabelecidos no vigente Código Florestal (Lei nº 12.651/12) cuja constitucionalidade restou atestada em quase sua inteireza pelo Supremo Tribunal Federal, não sem antes compreender que a mesma legitimidade que lhe deu surgimento será pedra de toque para a defesa hercúlea do evitamento, daqui por diante, de quaisquer retrocessos ambientais que certamente implicarão na perda de biodiversidade, no comprometimento dos mananciais, no agravamento do efeito estufa e na desertificação dos territórios onde vivemos.

Muitos anos se passaram entre o Código Florestal pretérito (Lei nº 4.771/65) e o atualmente vigente, a demandar a reflexão de que muito cuidado há de se ter com as eventuais tentativas de mudanças açodadas da novel legislação.

Caio Augusto Silva dos Santos, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção de São Paulo