Ainda se come lixo

Por José Renato Nalini

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  Inconcebível para a nação que se funda sobre uma Constituição democrática e avançada, conviver com seres humanos que se alimentam a partir daquilo que conseguem recuperar em lixões.

            O lixo do Brasil é um dos mais ricos do planeta. Tanto que alguns especialistas defendem que ele deva ser vendido e não que o povo pague por sua coleta. Um dos cruéis paradoxos desta República é a simultaneidade de dois opostos: o celeiro do mundo tem mais de trinta e três milhões de pessoas que passam fome todos os dias. Os famintos são os excluídos. Situam-se às margens da vida. Estão espalhados, mas um número considerável é de moradores em favelas.

            Muito se fala em favela, mas esta entidade é pouco estudada e conhecida. Há necessidade de elaboração de diagnóstico integrado propositivo, em que se leve em consideração uma pesquisa histórica, as questões ambiental e social, antes de oferecer uma proposta de solução.

            A cultura ESG pode ajudar o tratamento de um problema que parece insolúvel, como esse da fome crônica. Nada é impossível. Em tempos de extermínio da natureza, é preciso pensar em bioeconomia, estratégia de salvação da floresta e, principalmente, de salvação do povo que vive na floresta.

            É preciso enfrentar com coragem os inúmeros desafios postos pelo abandono a que o Estado condenou os excluídos. Há startups que podem ajudar a criar tecnologias importantes para corrigir distorções que permanecem diante da inércia do poder público e insensibilidade da população. O agro é pop, o agro é tudo, então onde está o agro diante da fome?

            Fala-se bastante em ODS, os objetivos de desenvolvimento sustentável, mas tais bandeiras estão no discurso e não na ação. Tudo deve começar na cidade. É nela que as pessoas moram. Não faz sentido deixar que essas habitações toscas e vulneráveis se multipliquem, ampliando as chagas abertas nesta sociedade complexa: aparentemente emotiva e fanatizada quanto a alguns assuntos, mas também cruel ao deixar de lado a obrigação de mudar o inaceitável ambiente social à vista de todos nós.

            Nenhum brasileiro deveria dormir tranquilo, enquanto houver um semelhante a passar fome e a remexer lixo para suprir suas necessidades vitais. O que você está fazendo para saciar a fome de seu irmão?

 

José Renato Nalini é Reitor da UNIREGISTRAL, docente da pós-graduação da UNINOVE e autor de “Ética Ambiental”.      

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