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Aktion T4: o aspecto pouco lembrado do Holocausto

 

O Dia Internacional da Memória do Holocausto, celebrado em 27 de janeiro, não é apenas um momento para lembrar as atrocidades cometidas pelo regime nazista, mas também para refletir sobre as diferentes faces dessa tragédia. Uma das menos lembradas é a operação Aktion T4, um programa que vitimou pessoas com deficiência sob o pretexto de “purificação racial” e “eficiência social”.

A Aktion T4 foi um programa de eutanásia conduzido pelo regime nazista entre 1939 e 1945, cujo objetivo era eliminar indivíduos considerados “improdutivos” ou “incapazes” de contribuir para a sociedade. Estima-se que mais de 275.000 pessoas, incluindo crianças, adultos e idosos com deficiências físicas e mentais, foram assassinadas durante esse programa.

Os métodos incluíam câmaras de gás, injeções letais e inanição deliberada, executados em instituições médicas transformadas em centros de extermínio. Em muitos casos, as famílias eram convencidas a entregar seus entes queridos para “tratamento”. Essas mortes eram frequentemente justificadas como “alívio para a família” ou “economia para o Estado”.

A lógica subjacente ao Aktion T4 era a da pureza racial e do produtivismo vazio, fundamentos da ideologia nazi-fascista. De acordo com essa visão, o valor de uma pessoa era determinado exclusivamente por sua capacidade de contribuir para o progresso material do coletivo. A pessoa humana não era vista como um fim em si mesma, mas como um instrumento para a prosperidade do Estado. Essa perspectiva desumanizadora não só justificava a eliminação dos considerados “inúteis”, mas também privava a sociedade de reconhecer o valor intrínseco da diversidade humana.

A crença de que as pessoas com deficiência eram um fardo para a sociedade foi amplamente disseminada. Famílias, pressionadas por um contexto social capacitista, muitas vezes consentiam em enviar seus parentes para a chamada solução. Essa situação revela como a desumanização e a estigmatização podem infiltrar-se profundamente no tecido social, levando a escolhas trágicas.

O pensamento nazista ignorava o fato de que a humanidade de cada indivíduo reside em sua individualidade. Características únicas, sejam habilidades, limitações ou perspectivas, enriquecem a coletividade. Ambientes plurais e inclusivos são mais criativos, inovadores e resilientes. A exclusão, por outro lado, empobrece e fragiliza a sociedade.

A construção de ambientes inclusivos exige a eliminação do capacitismo e de outras formas de preconceito. Todos devem ter a oportunidade de se desenvolver e serem protagonistas de suas vidas, independentemente de suas limitações. É um dever moral e social garantir que a diversidade seja celebrada e respeitada.

Lembrar o Aktion T4 não é apenas rememorar as vítimas, mas também reconhecer as armadilhas de um pensamento que prioriza a produtividade em detrimento da dignidade humana. Como disse Hillel, o Sábio: “Se não eu por mim, quem por mim? Se eu for só por mim, quem sou eu? Se não for agora, quando?”.

A luta por um mundo inclusivo é urgente, e passa pela reflexão sobre tragédias como essa e pela ação concreta em direção a um futuro mais justo e humano.

 

 

André Naves é defensor público federal formado em Direito pela USP, especialista em Direitos Humanos e Inclusão Social, mestre em Economia Política pela PUC/SP. Cientista político pela Hillsdale College e doutor em Economia pela Princeton University. Comendador cultural, escritor e professor (Instagram: @andrenaves.def).