1

Diocese de Assis

 

Se considerarmos a vida como oportunidade de contínuas descobertas, o que de fato é, há de se pensar ser esta uma longa estrada. Muitos já a definiram, cantaram e louvaram como estrada da vida. Não há melhor definição. Mas é exatamente numa pequena estrada, onze quilômetros apenas, que se dá a maior das revelações que a história humana já presenciou e testamentou: a estrada de Emaús, ligando esse pequeno povoado à Jerusalém, então capital da fé monoteísta, a fé do povo de Abrão, pai do Povo de Deus. No povoado de Emaús, ao partir o pão para os dois companheiros de viagem, Cristo se deixou reconhecer como senhor da vida e da morte.

O processo dessa revelação foi gradativo, à medida que trilhavam aquele caminho com um desconhecido que parecia ignorar os últimos acontecimentos que destruíram as esperanças de libertação do povo de Israel. “Tu não sabes o que aconteceu nos últimos dias?”. Colocado diante de uma aparente catástrofe, Jesus ironiza momentaneamente a pouca inteligência e lentidão dos seus, por não compreenderem e aceitarem “tudo o que os profetas falaram” a respeito do Messias.

Nosso desafio, hoje, é colocar esse fato histórico como fonte de revelações que a doutrina cristã sempre apontou como essenciais para o crescimento da nossa fé. Não é só um simples ato e concordância submissa, sem compreensão, sem questionamentos, nem mesmo dentro da lógica que tudo governa. A estrada de Emaús foi o caminho do diálogo do ser humano atônito com o que a realidade lhe apresentava, com a experiência agora concreta, cabal e extraordinariamente vivificante da certeza de que Cristo Ressuscitado ainda caminha com seu povo, perfaz nossas estradas como companheiro de viagem a colocar luzes sobre as trevas que ainda ofuscam nossa fé pequena, a dialogar conosco mostrando a plenitude das profecias ditas a seu respeito, a nos ensinar com a paciência e generosidade que sempre caracterizou seu ministério, a provocar em seus discípulos a mais grata das revelações: “Não estava ardendo o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?” (Lc, 24, 32). Essa é a mais feliz das descobertas, a mais agradável das revelações da nossa estrada após a tragédia do calvário.

Em suma, nós, os discípulos que “descem” de Jerusalém possuídos pelas incertezas de uma cruenta realidade, não temos mais o que temer. Se o Mestre foi capaz de nos reanimar, nos alimentar espiritualmente com suas Palavras, nos partir e repartir o Pão, essencial para a fortaleza do Espírito que nos conduz, agora nos devolve à Jerusalém terrestre, como emissários de suas Revelações e agentes renovados em seu ardor missionário. Afinal, a missão que era Dele agora é nossa. O anúncio tão bem proclamado e explicitado através do seu ministério de paixão sem limites agora salta de nossas vidas, a loucura quase utópica, porém possível de se realizar, de um sonho de fraternidade universal, é nossa causa urgente, urgentíssima, diante da cegueira que entorpece a mente e o coração humano. Sim, Cristo vive e caminha conosco! A estrada de Emaús perfaz e refaz nossa aparente esperança perdida. Ainda é tempo. A estrada é curta, mas a promessa é maior!

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]




Diocese de Assis

Chegamos a um ponto em que para tudo se exige uma contraprova ou ao menos a prova dos nove. Dois mais dois igual a quatro. Acreditar no que não se vê tornou-se uma atitude quase utópica, uma posição contrária à lógica dum mundo excessivamente plausível, palpável, imediatista, irremediavelmente materialista. A fé do homem moderno está lastreada à sua lógica e razões científicas. Seu imaginário pode sonhar, voar, mas suas ações não coadunam com visões e ou crenças imaginárias ou fora do contexto físico, material, plausível. Como, pois, acreditar num retorno à vida de alguém comprovadamente morto e sepultado?
A fé de Tomé era coerente com aquilo que ele bem viu e testemunhou com muita dor e lágrimas nos olhos. Afinal, caminhou à distância e atônito com o que testemunhava, aquela via crucis de humilhação, acerbada injustiça, ironia sem limite, escárnio e degradação de qualquer dignidade que se pudesse dizer humana, insensibilidade fora da medida, impiedade até o fim… E o lance da certificação da morte, com aquela espada a lhe perfurar o peito? E as últimas gotas de sangue e água a sulcar aquele chão do indiferentismo crucial? Tudo isso Tomé presenciou, até mesmo o apressado sepultamento ao cair daquela tétrica noite. Como então acreditar numa fábula de ressurreição? Tomé estava certo: era preciso ver, ouvir, tocar, antes de qualquer nova esperança, qualquer afirmativa de um milagre tão impossível e grandioso. Cristo vive! Como assim?
Acontece que a fé supera tudo, até portas fechadas, até a morte aparente, a última das barreiras de qualquer ser vivo. Aqui reside a grandiosidade da fé cristã, capaz de vencer os túmulos das nossas incertezas e inseguranças, para nos apresentar as chagas e o lado ainda em aberto, mas como provas incontestes de uma vida maior que aquela massacrada e aparentemente vencida pelos grilhões do pecado humano. Maior pecado não há do que negar o mistério da redenção, o milagre da Encarnação e Remissão de um Deus Conosco, Emanuel. O mistério Pascal é exatamente o milagre da morte vencida, esta que nos assombra sempre como ponto final de uma existência meramente física, passageira, mortal. Colocar o dedo nas feridas do Redentor, tocar seu lado aberto pela indiferença dos poderes e da ordem farisaica dos que pensam nos conduzir, é seguir a lógica que conduz nossas vidas. Fugir desta e contemplar a luz transcendente do mistério de um Cristo translúcido, fulgurante em sua vitória sobre a morte, é ter a graça e o privilégio de tocar suas feridas, comprovar sua ressurreição. Aquele que um dia duvidara agora se prostrava diante da maior revelação da fé cristã: Cristo ressuscitou, aleluia! Agora só nos compete dizer, como Tomé prostrado diante do mistério que contemplava: “Meu Senhor e meu Deus!”
Acontece que ainda teimamos com nossas lógicas imediatistas. De Tomé e seu comportamento cético temos muito. Ele nos representa. Talvez não mereçamos o privilégio daquele encontro pessoal que o apóstolo vivenciou, mas com certeza esse “encontro” nos esteja reservado num plano superior, porém não menos significativo do que a visão dos discípulos naquela casa fechada. Fechada pelo medo das ameaças externas, da intolerância e incompreensão dum mundo agnóstico, sem fé, sem esperanças maiores. Não é nosso caso. Nossa esperança é maior do que as desilusões que nos cercam. Nossa vida é maior que os túmulos destinado aos despojos de uma existência fugaz. Nossa fé vai além da visão terrena e da cegueira espiritual dos que questionam essa maneira simples de contemplar o milagre da vida: “Bem-aventurados os que creram sem terem visto!”
WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]




Diocese de Assis

 

          A simples visão de um túmulo é sempre algo desagradável. Mais ainda quando o encontramos de portas abertas, escancaradas, à espera de um novo hóspede. Pior ainda quando o percebemos vazio, novinho em folha, como se fosse uma encomenda nossa, pronta a receber alguém que amamos. E, o mais lastimável, saber que aquele em especial era provisório, emprestado por um amigo da família, que deveria ser devolvido tão logo se encerrassem os festejos da “passagem do Anjo da Morte”, o momento que o povo celebrava enquanto uma família chorava a “passagem” de um dos seus… Mas o túmulo agora estava vazio! Quem roubou o corpo do Mestre?

Essa era a situação ao redor da sepultura de Jesus naquela manhã do Domingo de Páscoa ainda judaica. Enquanto o povo israelita celebrava o dia de sua libertação do jugo do Egito, alguns poucos seguidores do mestre cristão ainda choravam sua morte de cruz. Alguns familiares e amigos se dirigiam ao túmulo provisório para as providências necessárias a um sepultamento definitivo; mas eis que encontram um túmulo vazio!

Pedro constatou o problema, mas Madalena seria a primeira a desvendar o enigma. O Senhor que lhe dera tantas e tantas provas de sua missão divina, que se dissera ser a “Ressurreição e a Vida”, que tirara do túmulo o amigo Lázaro, que devolvera esperança e dignidade a tantos cegos, aleijados e mudos, que se apiedara da viúva de Naim e lhe devolvera da morte o único filho, que saciara a fome e a sede de centenas e restaurara o sentido da vida a outras centenas de desiludidos e desesperançados, como ela… Ah! Madalena se negava a aceitar aquela situação de morte, aquela nova desilusão em sua vida, a morte Daquele a quem dissera com o coração aberto e maravilhado: “Meu Senhor e meu Deus!”

Então, após sua primeira aparição, aquela maravilhosa manifestação de poder e glória, saiu em disparada até os seus, gritando e exclamando: “Eu vi o Senhor, eu vi o Senhor!” Essa é a plenitude das revelações. Constatar um túmulo vazio e logo após compreender sua transitoriedade, seu significado inútil e passageiro diante da imortalidade da alma e da superação dos limites terrenos é o maior estágio que uma revelação de fé pode alcançar. Vida ressurrecta não ocupa os túmulos da vida carnal. É vida nova em Cristo. É o mais elevado estágio da plenitude existencial que se pode alcançar neste mundo. “Se Cristo não ressuscitasse nossa fé seria vã”, diria o apóstolo convertido, aquele que deixara de lado o vazio de sua incredulidade pagã para se revestir do escudo da imortalidade cristã. Isso é viver a plenitude da fé. Isso é entender a vida como força única do amor divino, gerado no amor e não criado na matéria apenas, tal qual Cristo em sua passagem terrena, que ressurgiu dos mortos para nos restaurar a vida plena. O rito da páscoa judaica ficou na lembrança, na celebração de um acontecimento histórico, conquanto o rito da páscoa cristã não é uma “recordação” do passado, mas uma “renovação” do presente que precisamos aprimorar. Paulo descobriu isso em sua vida: “Já não sou eu quem vivo, é Cristo que vive em mim”. Essa é a descoberta que nos falta para bem vivenciarmos nossa Páscoa.

Imaginemos aquele túmulo vazio que o amigo Arimatéia emprestou momentaneamente  e se tornou prova da glorificação cristã. Não era mais do que um buraco cavado na rocha. Assim construímos os túmulos que nos sepultam em vida, indiferentes aos mistérios que nos cercam, pois a realidade nos apresenta apenas o pó que ainda somos. Mas vencer o sepulcro das nossas falácias e derrotas existenciais é preencher os vazios da nossa incredulidade. É sair da inercia de uma fé sem ação e gritar ao mundo a verdade que nossa “passagem”, nossa Páscoa definitiva revela ao mundo: “Ressuscitou! Ele não está aqui”, está escrito no túmulo vazio da velha Jerusalém.

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]

 

 




Diocese de Assis

 

Nada há, no mundo moderno, que prefigure com fidelidade as pompas, honras e respeito que a figura real possa despertar em um povo submisso. Os reis atuais já não gozam de tantos privilégios. A realeza humana está em decadência. Nos tempos de Jesus a figura real ainda possuía uma mística próxima ao status divino, que despertava no povo euforia pela simples passagem de um rei ou temores pelo que este pudesse decretar ou exigir do próprio povo. Neste estágio de reconhecimento popular se deu a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, aclamado como rei e venerado como a nova esperança daquele povo cansado e oprimido pelos reinados vigentes. Era hora de mudar.

A cena surreal e improvisada é tão espontânea que quase chega ao ridículo. Imaginem um rei montado num jumentinho sendo introduzido ao seu palácio sob a aclamação de ramos de palmeiras e mantos suados e surrados estendidos à sua passagem. Estava bem distante das pompas e galhardias que exigiam qualquer poder temporal, qualquer suntuosidade real. Mas, no caso, o reconhecimento popular possuía autenticidade. Então, “Hosana ao Filho de Davi”, bendito é Aquele que vem!”.

Assim imaginando, a cena nos leva também a pesar a motivação desta. O povo já não aguentava mais tantas situações de mando e desmando, tanta injustiça e humilhação. Era hora do basta! Custasse o que custasse, a voz da verdade proferida por aquele nazareno, sem pompas, sem arrogância no falar, mas com palavras conscientes e objetivas, despertou no povo o adormecido senso de justiça. Mesmo ao afirmar que seu Reino não era desse mundo, ao menos a sombra de suas revelações reluziam na consciência de seus ouvintes e devolviam ao povo o direito de sonhar. Por que não? Se suas palavras iluminavam a realidade com nova esperança, outro não seria o rei desejado e ansiosamente esperado por aquele povo: “Bendito o que vem em nome do Senhor! Hosana nas alturas!”.

Todavia, as ilusões das massas são facilmente manipuláveis, de acordo com seus interesses setoriais, grupais, políticos ou mesmo religiosos. Sempre foi assim. Basta pesar o interesse da maioria ou a força dominadora que conduz esses interesses. Aqui entra a manipulação das massas, essa força motriz que muitas vezes se sobrepõe às reais necessidades do povo. Jesus ou Barrabás? Rapidamente, o poder da coerção – sempre ligado ao poder político e financeiro – vai ditar as regras e profanar a escolha santa e isenta do melhor caminho.  O mesmo povo que introduziu Jesus pelas ruas de Jerusalém como verdadeiro Rei e Senhor; esse mesmo povo haveria de gritar: “Crucifica-o, crucifica-o”!

Como entender essa dualidade? Não há muito a se explicar senão apenas lamentar nossas incertezas diante das diferenças entre os Reinos Celestiais e o reinado humano. Lá impera a Verdade, a lúcida e transparente realeza da Verdade Suprema. Aqui ainda somos dominados e manietados pela voz da mentira, a astucia da maldade e do jogo de interesses pessoais, corporativos, setoriais, que conduzem e sempre conduziram os reinados desse mundo. A escolha é nossa. Decidir entre as ilusórias promessas de segurança, bem estar ou privilégios que o mundo nos faz e a realidade da Promessa que Cristo nos trouxe é o que temos. E agora? Jesus ou Barrabás? Se sua vida ainda está presa aos sonhos e ambições que a vida terrena possa lhe proporcionar, lhe sobra Barrabás. Mas se você já atingiu o estágio de uma esperança sem ilusões terrenas, Jesus é o seu Rei.

          WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]

 

 




Diocese de Assis

As festas são tão antigas quanto a humanidade. Celebrar uma festa é viver de maneira diferente os acontecimentos e, ao mesmo tempo recordar, reatualizar e aprovar o mundo que se efetua, permanentemente, todos os dias.

O significado existencial das festas está enraizado nos fatos significativos da vida pessoal, familiar, social e comunitária. Por isso, sendo o homem religioso por natureza, expressa na ação de graças o que a história “escreveu” em sua vida.

A Semana Santa tem as suas raízes mais profundas no “acontecimento” Jesus Cristo. Quer dizer, no mistério de sua paixão (sofrimento), morte e ressurreição. Esta trajetória do Salvador nós chamamos de “Mistério Pascal”.

O Mistério Pascal é o “fato primordial” da nossa fé e o centro de todas as celebrações litúrgicas cristãs.

Domingo de Ramos. A Semana Santa começa com o Domingo de Ramos. Neste dia se recorda e se celebra a entrada de Jesus de Nazaré em Jerusalém, como Rei. Fato característico de seu poderio e reinado é a humildade e simplicidade: chega montado num burrico e é aclamado com ramos de oliveira. Somos envolvidos de maneira própria, nesta celebração, aclamando e saudando o Cristo como nosso Rei e Salvador.  É com a simplicidade dos ramos que devemos aclamar o nosso Rei. “Hosana ao Filho de Davi.”

Segunda, terça e quarta-feira. São dias marcados também pelo recolhimento pessoal. Não há, porém, nada de extraordinário. A oração deve ser o conteúdo e a marca destes dias, como uma preparação e predisposição pessoal para o tríduo pascal.

Missa dos Santos óleos. Na segunda-feira, de modo particular em nossa diocese, o dia está voltado para a espiritualidade e o ministério do padre na Igreja e, para a bênção e consagração dos “santos óleos” que serão usados nos sacramentos do Batismo, Unção dos Enfermos e Crisma.

O Tríduo Pascal, como o próprio nome diz, é o tempo composto de três dias, que antecede e prepara a grande proclamação do aleluia, da ressurreição, da páscoa, do DOMINGO. Nestes três dias vivenciamos os gestos, palavras e atitudes de Cristo que expõe, claramente, a sua missão de Salvador e Redentor.

Quinta-feira. É o dia da Instituição do Sacerdócio Católico e da Eucaristia. Em outras palavras, o dia em que Jesus “inventou” o serviço ministerial consagrado do padre e a missa.

Nesse dia acontece a missa do lava-pés, gesto de Jesus que ensina que o primeiro no Reino de Deus é aquele que serve e é capaz de “lavar os pés” dos outros. Após a missa, segue a Adoração ao Santíssimo Sacramento (Hóstia Consagrada), até sexta feira. Ocasião da experiência e reconhecimento de Cristo como nosso Alimento: Pão vivo do céu.

Sexta-feira. Chamada também de “sexta-feira maior”, este dia “encaramos” e celebramos a morte do Senhor Jesus em razão do seu amor por nós. Este é o único dia do ano que não pode ter missa. É dia de Jejum e abstinência de carne. Há apenas a adoração da Santa Cruz à tarde e a procissão do Senhor Morto. Momentos de profunda comunhão com um Deus que doa a sua vida por nós, sem reservas.

Sábado Santo. Conhecido como “Sábado Aleluia”, este é o dia da Vigília Pascal, isto é, de ficar acordado, atento e desperto para o “raiar do dia” para a explosão da luz do ressuscitado. Esta é a razão pela qual se faz a bênção do fogo. De acordo com antigo costume, neste dia pode também ser feito batismo de adulto.

Domingo da Ressurreição. Este é o auge de toda a Semana Santa. É o dia da ressurreição, da páscoa, da “passagem” da morte para a vida. O Cristo está vivo! Deus o tirou das garras da morte: “porque procurar entre os mortos aquele que está vivo?” Deste dia é que se tira o fundamento da fé Cristã. Neste dia é que está enraizada a nossa fé e a nossa religião.

Participemos por completo da Semana Santa e experimentemos a força de um Deus que ultrapassou os limites para nos SALVAR.

PE. EDIVALDO PEREIRA DOS SANTOS 




Diocese de Assis

Quem nunca viu partir um parente, um amigo, um irmão de fé, camarada? Até Cristo chorou pela morte de um amigo. A dor da morte é um sentimento inexplicável, que todos um dia experimentamos, que rejeitamos sempre pois nunca estamos devidamente preparados para perdas em nossas vidas. Então é isso: rejeitamos a morte e ponto.
Mas como lidar com essa realidade, quando bem o sabemos ser inevitável esse momento? Se Cristo chorou diante da morte, o que se dirá de nós, simples mortais. A diferença está na perspectiva da nossa visão limitada, quando o mestre dos mistérios celestes falava de ressurreição; mais ainda, se dizia Ele próprio ser “a ressurreição e a vida”. Assim, só é possível compreender e justificar o choro de Cristo como uma atitude de piedade, quase frustração diante da limitada visão humana sobre a única certeza que aqui temos: dessa ninguém escapa!
Quem se acerca de Cristo e de suas Palavras, busca respostas que não existem na lógica terrena. É Ele o único mediador entre os mistérios celestes e a realidade terrena, fontes de nossa esperança e causa de nossas aflições, nosso demasiado apego ao que sentimos, vemos, tocamos… A certeza de ser ouvido é tudo em Cristo: “Pai, eu te dou graças porque me ouviste. Eu sei que sempre me escutas (Jo 27, 41-42)”. A dúvida não está em Jesus, mas no povo que o rodeia, que necessita de milagres, de sinais fora da lógica e da realidade “que cheira mal”, que aterroriza e dilacera nossos corações. Quem assim não procede diante da morte? Mas, na perspectiva de Jesus, ela é apenas circunstancial, tão passageira quanto a vida que tanto prezamos. “Então Jesus lhes disse: ‘Desatai-o e deixai-o caminhar’. Talvez seja esta a afirmativa mais reveladora da morte de Lázaro, o amigo “que Jesus amava”… É preciso que desatemos os nós que nos impedem de uma caminhada maior, uma visão mais ampla da realidade que aqui ocupamos. A vida não pode ser um quadrante limitado por alguns anos, rápidos e fugazes, que nos permitem pensar, sonhar e morrer na praia. Não dá para entender a vida como tão simples e passageira. Isso é muito pouco.
Para se alcançar uma segunda chance de vida, mesmo diante da realidade que nos cerca, é preciso solidificar nossos laços de amor fraternal, familiar, social, ou seja, construir a sonhada fraternidade, o sentimento de solidariedade que nos identifica como raça única nesse Universo de mistérios. A vida é passageira? É, não podemos negar. Mas a morte ainda é uma ilustre desconhecida, da qual não podemos fugir. O fato é que na casa de Betânia a amizade com Cristo fez a diferença. Mesmo que o cenário de desolação, a dor da perda e a putrefação da esperança dominassem a realidade, a presença de Jesus recobraria os sinais de uma vida nova, os laços de amor e amizade que os uniam. Essa presença justifica nossa esperança.
Diante da realidade da morte e da promessa de vida nova que a fé em Cristo nos oferece, fico com a segunda possibilidade. Afinal, sua vida e extremado amor por aqueles que dele se acercaram foi prova de uma amizade sem limites. Uma amizade capaz de dar a vida, de sofrer pela perspectiva da morte, mas tudo superar na glória da ressurreição. “Coragem, eu venci o mundo”! diria Jesus.
PS. Esse artigo dedico ao sobrinho Carlos Negrão Bizzoto, que faleceu nesta semana, vencido por um câncer, mas vitorioso pela perspectiva de vida nova em Cristo.
WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]




Diocese de Assis

A quaresma é uma ótima oportunidade de mudança e conversão que redundam em crescimento humano em vários sentidos. Mas há uma coisa que, na quaresma, podemos fazer de maneira mais profunda: a busca de sentido para a vida, justamente em meio a fragmentação dos valores e a perda de sentido.

Não podemos esperar atitudes surpreendentes, comportamentos surpreendentes, decisões surpreendentes, projetos surpreendentes ou qualquer outra coisa surpreendente de quem ousa perpetuar as mesmas idéias simplistas sobre os acontecimentos, sobre os momentos, sobre os tempos e sobre a vida.

A Quaresma está ai!   Não é uma mera invenção humana e nem um artifício religioso. Pelo contrário, é uma necessidade existencial que está inscrita no coração da humanidade que é o encontro consigo mesmo.

Apesar de ser uma “instituição” da Igreja Católica, a Quaresma nasceu com o homem.  Portanto é de cada um de nós. A Igreja não é a dona, mas tem uma missão milenar de Mãe e Mestra para ler, interpretar e ritualizar este itinerário que compete à vida humana.

Temos e guardamos muitas idéias sobre tudo na vida. Contraditório ou não, quase sempre, sabemos muito pouco sobre a vida, porque sabemos muito pouco sobre nós mesmos. A questão básica é que, estamos ocupados com tudo neste mundo: trabalho, família, dívida, escola, crise…, menos conosco. Dia por dia, estamos nos desocupando cada vez mais de nós mesmos e, isso é mal.

Aonde queremos chegar? O que queremos provar?

A sombra do egoísmo nos transformou em maus altruístas. Tentamos cuidar muito bem dos outros, mas não cuidamos de nós mesmos. Isso é contraditório! Ninguém pode cuidar bem dos outros quando não cuida bem de si mesmo; ninguém respeita aos outros, quando não respeita a si mesmo; ninguém é fiel aos outros quando não é fiel a si mesmo; ninguém pode amar os outros quando não ama a si mesmo.

Precisamos nos libertar da falsa idéia de que o cuidado conosco mesmo é sintoma de egoísmo. O cuidado consigo é um dos princípios bíblicos mais genuínos do amor verdadeiro.

A busca de si mesmo! Este é o ideal perdido, numa sociedade liberal que promoveu o altruísmo, mas, não fez emergir a fraternidade; que suscitou desejos e necessidades, mas, não satisfez a fome; que criou o individualismo, mas, não fez nascer indivíduos que são sujeitos.

Será que o mundo nos conhece como gente, como pessoas, como humanos?

Fomos convertidos em número, em cifra, em estatística. Mas, nós somos gente. Precisamos fazer a volta sem revolta; precisamos de conversão sem inversão; precisamos de nós mesmos.

Devemos buscar não apenas a explicação para guardar os quarenta dias da quaresma, mas a motivação.

Quarenta anos o Povo de Deus comeu o `maná  no deserto (Ex 16,35; Nm 14,33). Moisés ficou sobre a montanha do Sinai, quarenta dias e quarenta noites (Ex 24,18; Dt 9,9). Quarenta dias e quarenta noites choveu sobre a terra, formando o dilúvio (Gn 7,4). Um aviso foi dado: “Dentro de quarenta dias, se não se converterem, Nínive será destruída” (Jn 3,4). Por quarenta dias e quarenta noites, Jesus esteve jejuando no deserto (Mt 4,1-11; Mc 1,12-13; Lc 4,1-13). E você!?

O número quarenta deixa de ser um simples número, uma seqüência numérica para ser um evento existencial necessário e indispensável. Será que vamos desprezar mais esta nova chance? Ainda dá tempo!

Vamos viver os nossos “quarenta dias”.

PE. EDIVALDO PEREIRA DOS SANTOS




Diocese de Assis

 

“Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos abençoou com toda bênção espiritual nos céus, em Cristo. Nele, Deus nos escolheu, antes da fundação do mundo, para sermos santos e íntegros diante dele, no amor” (Ef 1,3-4).

Nossa vida tem sentido mas, esse sentido que já existe, desde antes da criação do mundo (Ef 1,4), a gente só o encontra buscando dia e noite, sempre. Não porque a gente não o encontra, mas, porque a cada vez que o encontramos, o desejo de buscá-lo e anunciá-lo aos outros só aumenta, até a plenitude do encontro definitivo. É bem aí que está a verdadeira razão da nossa existência porque, esta é nossa vocação e missão.

Acertou o papa Francisco quando, iniciando o seu pontificado, disse para toda a Igreja: “A Alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus. Quantos se deixam salvar por Ele são libertados do pecado, da tristeza, do vazio interior, do isolamento. Com Jesus Cristo, renasce sem cessar a alegria” (Papa Francisco – A Alegria do Evangelho, nº 1).

Somos discípulos missionários da Alegria do Evangelho que enche o nosso coração e a nossa vida inteira e nos impulsiona a ser, viver e fazer como Jesus que, enviado pelo Pai, entregou sua vida em vista do Reino Definitivo.

A indiferença, a omissão, o descompromisso, o distanciamento… não cabem na vida de quem segue a Jesus e não deveriam bagunçar a nossa forma de levar a fé e praticar a religião.

O nosso testemunho para o mundo é a busca e o encontro, o amor e o serviço em nome daquele que, desde sempre, tomou e continua tomando a iniciativa, abençoando-nos, escolhendo-nos e enviando-nos.

Para nós, a vida de São Francisco é um grande estímulo e um exemplo porque inspira a busca de Cristo. O encontro e chamado de Francisco aconteceu de maneira mais clara diante da Cruz de São Damião. Enquanto rezava, contemplando o Cristo na cruz, Francisco se viu tremendamente tocado pelo Senhor que lhe disse: “Francisco: vai e reconstrói a minha Igreja!”. Esse encontro e chamado mudou sua vida radicalmente, levando-o ao desapego dos bens, à vida simples e humilde, ao cuidado dos pobres – especialmente os leprosos – e à vida fraterna. Seu estilo de vida transformou a igreja em seu tempo e ainda hoje. Exemplo claro é o nosso papa que, adotou o nome de Francisco por causa do santo, além de chamar o mundo todo para dois cuidados: primeiro, o cuidado com a casa comum, com a encíclica Laudato Si, inspirado no cântico das Criaturas feito por São Francisco e o cuidado com os pobres, criando a Jornada Mundial dos pobres. Continuemos a aprender com São Francisco, como amar, servir e seguir Jesus.

Olhando para Maria temos, também, um grande farol iluminando nossos passos em direção ao seu filho Jesus. Ela nos ajuda a dizer e renovar o nosso sim diário com o seu: “Eis aqui a serva [o servo] do Senhor! Faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1,38). Ela nos ensina a guardar todos os acontecimentos e meditar sobre eles, no coração Lc 2,19). Ela nos mostra como devemos seguir Jesus, exortando: “Fazei tudo o que ele vos disser” (Jo 2,5). Ela nos inspira a perseverança, mesmo nas horas mais difíceis, permanecendo junto dele, aos pés da cruz (Jo 19,25-27). E, finalmente, ela nos faz entender que, permanecendo na comunidade, somos iluminados e impulsionados com os dons do Espírito Santo para o amor, a conversão e a missão, num Pentecostes permanente (At 2,1-11).

Ninguém nasce pronto e acabado! É no seguimento a Jesus, que nossa vida vai crescendo até atingir a maturidade. Estamos falando de uma caminhada do dia a dia que mistura alegria e tristeza, saúde e doença, vida e morte. Que não nos falte perseverança para o caminho e a caminhada!

PE. EDIVALDO PEREIRA DOS SANTOS




Diocese de Assis

 

Alimentar um povo não é só lhe oferecer o pão, o básico para sua sobrevivência. Isso é relativamente fácil, basta vontade e compaixão. Há porém uma outra forma de alimento, também essencial, que fortalece o espírito humano com a solidariedade necessária para uma convivência harmoniosa: é o alimento da verdade, aquele que nutre corpo e alma e dá à vida um novo sentido. Aqui nos deparamos com os mistérios e as necessidades vitais que todo ser humano tenta compreender e alimentar no seu dia-a-dia. Alimentar-se com o pão da terra e também o pão do céu, aquele que a graça de Deus derramou no deserto… “Os discípulos de Jesus são formados para a confiança na graça de Deus, que alimenta uma multidão mesmo quando os recursos à disposição sejam aparentemente insuficientes” (CF 142).

Eucaristia é o nome do milagre! “Não só de pão vive o homem – disse Jesus – mas de toda a palavra..” E no banquete eucarístico Ele foi enfático ao proclamar: “Isto é o meu corpo”. Não usou palavras dúbias para associar a fome humana às necessidades espirituais e ao mistério presente naquela mesa. “Jesus, assim, acresce ao compromisso de repartir e distribuir a Eucaristia a responsabilidade pela fome dos irmãos, o comprometimento sobre as necessidades mútuas” (144). Magistralmente, hoje Ele nos diz: “O meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra” (Jo 5,34). Outra não é esta obra senão a construção da fraternidade universal. Alimentar esse povo é nossa responsabilidade social. Então nossos bispos enfatizam: “Hoje, a Igreja precisa relembrar às comunidades contemporâneas que a celebração da Eucaristia não nos faz uma comunidade de eleitos, separados do restante do mundo, premiados com uma realidade sublime, mas nos transforma em pessoas incumbidas da missão dada por Jesus” (146).

Sem compaixão não pode haver cristianismo. Sem essa visão que emana da mesa eucarística, nossa comunhão com Cristo é incompleta. “Na Eucaristia recebemos Cristo que tem fome no mundo” (153). Essa relação está intimamente ligada à ação da Igreja, pois dela derivam atos e atitudes que diferenciam um gesto cristão de qualquer gesto político. Bem nos disse Papa Francisco em uma de suas exortações: “é nocivo e ideológico também o erro das pessoas que vivem suspeitando do compromisso social dos outros, considerando-o algo de superficial, mundano, secularizado, imanentista, comunista, populista; ou então relativizam-no como se houvesse outras coisas mais importantes” (G.E.) A vida eucarística do povo de Deus é o rótulo que nos identifica como irmãos, sem as divisões toscas e oportunistas que hoje nos impingem. Só se sacia o faminto com o pão da Verdade, quando por primeiro lhe oferecemos o pão de cada dia. Não há outro caminho. “Não podes comer este Pão, se não deres o pão aos famintos” (154).

Assim chegamos ao final das reflexões de mais uma oportuna Campanha da Fraternidade a coroar nosso período quaresmal. Nossos bispos foram mais uma vez zelosos guardiões de sua missão apostólica. Sobra-nos a ação “para transformar a realidade da fome”. O maná do deserto renovou as forças do povo de Deus para alcançar a Terra Prometida. Jesus se apresentou como novo maná, o pão-vivo também descido do céu. Eis o caminho da libertação, as pistas necessárias que a doutrina cristã oferece ao mundo, conclamando todos à responsabilidade social. “Dai-lhes vós mesmos de comer”. E pontifica: “O motor do nosso agir não é outro senão a mística do Seguimento de Jesus” (158). Outro nome não há. Senhor, tenha compaixão!

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]




Diocese de Assis

 

          ‘’Diante do tema escolhido para a Campanha da Fraternidade de 2023, a Igreja do Brasil também se coloca a serviço do Evangelho” (114). Não é um tema político e oportunista como já ouvi por aí, como se o catolicismo brasileiro estive usando o momento histórico de uma transição de poderes para colocar lenha na fogueira (disse-me um interlocutor). Ao contrário, “é uma expressão de coragem deixar que o Evangelho nos interpele uma vez mais com o mandato tão claro e desafiador de Jesus: “Dai-lhes vós mesmos de comer!” (Mt 14,16). Não é fácil ouvir o chamado à responsabilidade” (113).

          Não vamos fazer vista grossa a um problema que nos diz respeito. A fome está aí e só não a sente quem tem o estômago saciado e a mesa farta. O que a Igreja faz, em sua missão profética, é apenas iluminar a realidade, mostrando a ferida aberta, a chaga que uma sociedade não solidária só faz crescer. “A retenção egoísta por parte de poucos leva ao perecimento, assim como no deserto: não o perecimento do alimento, mas daqueles que não o têm” (117). Alimento retido egoisticamente apodrece junto com aqueles que o retem. Nenhum proveito terá. Oferecer alimento é, portanto, gesto de acolhimento à pessoa de Cristo. “Não se pode deixar de perceber que o próprio Jesus utiliza da imagem do pão para referir-se ao significado da própria pessoa” (121).

          A dinâmica do acolhimento e da solidariedade é própria do cristianismo autêntico. Ser cristão é isso. “Ele se esvazia do próprio sofrimento para dar lugar, em seu próprio coração, ao sofrimento do outro” (128). O acolhimento é marca registrada do cristianismo amadurecido. “As multidões se sentam na relva e comem com fartura, porque se sentem protegidas e amparadas, encontram em Jesus o lugar onde podem depositar aquilo que trazem sobre os ombros: não bolsas e alforjes, mas as preocupações e o peso da luta diária, que mais tarde o próprio Jesus carregará sobre os próprios ombros no pesado madeiro da cruz” (129). Querem maiores razões para a razão de ser da Igreja no mundo? Para exercitar aquilo que os identifica na caminhada da fé; agir como Jesus agiu? “Mas quem age com passividade diante da fome constatada une sua voz à de Caim” (134).

          O que não se pode admitir num contexto de igreja é a divisão por questões teológicas e ou políticas. Vergonhosamente, há muitos padres e paróquias, como igualmente muitos fiéis, contrários à atual campanha. Nada se constrói com espíritos divergentes. Buscamos, por primeiro a unidade, para nela encontrarmos o bem comum, o espírito de fraternidade que desde sempre nos identificou como povo eleito. Construir caminhos opostos é voltar para a peregrinação do deserto, onde padecemos a incerteza de se alcançar a terra prometida, as graças da vida plena. “A questão é: estamos dispostos a progredir nesse deserto, alcançando um primeiro estágio de percepção das necessidades do outro, mas também nos dispondo ao segundo estágio, que é assumir nossa responsabilidade sobre as necessidades do outro?” (138). Não há aqui nenhuma questão política, mas genuinamente solidária, fraterna.

          Aos que divergem dessa linha de raciocínio, meus sentimentos. Fugir da realidade por questões meramente transitórias, que se contrapõem ao testemunho da vida cristã, que expõem diferenças e divergências dentro de uma comunidade outrora sinônimo de fraternidade, de unidade, ora, ora… isso apenas nos envergonha. “Com frequência, os profetas manifestaram sua indignação diante da injustiça. Jesus também o fez, especialmente quando essas estruturas se aliaram ao Templo, para oprimir as pessoas sob a máscara de uma observância religiosa vazia” (141). Então? Você faz parte dessa religiosidade sem ação?

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]