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Diocese de Assis

Vivi a envolvente experiência de uma sedutora e bem contada história cinematográfica. O filme Dois Papas, do cineasta brasileiro Fernando Meirelles, a princípio me cativou e roubou-me alguns aplausos, especialmente pela impecável atuação e similaridade física dos atores principais com seus representados, que foram capazes de prender o público num enredo recheado de fatos reais e da licenciosidade poética do produtor brasileiro. Verdade e ficção bailam à nossa frente sem que possamos identificá-las de imediato. Um recurso comum a filmes dessa espécie, que mostram histórias verdadeiras costurando a realidade com a tendenciosa linha da mentira bem contada. Fica então a pergunta: o que está por trás dessa brilhante película que a sétima arte humana nos oferece?

Vejam que não deixo de aplaudir a beleza desse filme. Mas tenho meus pés pisando cautelosamente o chão da realidade. Primeiro porque ninguém de princípios mundanos vai contar gratuitamente uma história de fé, sem a astúcia demoníaca dos que tentam destruir a solidez da Igreja. O mundo não aceita a doutrina cristã sem antes questionar, pressionar, criticar e ridicularizar muitos dos seus princípios ou dogmas contrários à futilidade de uma vida sem regras. Esse é o poder sonhado e incansavelmente perseguido pelo Pai da Mentira, cuja sutileza e sagacidade atua em todos os campos da inteligência humana. Até na sua arte. Em especial, na envolvente arte cinematográfica. O Demônio sabe disso.

Tanto sabe, que são incontáveis os produtos dessa arte com o dedo satânico da crítica, persuasão ou simples ridicularização da fé cristã nos últimos tempos. Títulos como “A última tentação de Cristo” (1998), “Je vos salue, Marie” (1985), “A paixão de Cristo” (2004), “Jesus Cristo Superstar” (1993) e mais recentemente a triste paródia brasileira denominada “A primeira tentação de Cristo”, que superou em muito a ousadia diabólica na arte de publicar suas blasfêmias contra a fé. Não podemos menosprezar a inteligência do Demônio. Então repito a pergunta similar àquela de Pilatos: onde está a verdade?

A astucia diabólica do filme em questão está em confrontar posições de dois líderes contemporâneos. O enredo se limitou a diálogos de várias reuniões “imaginárias” entre o Papa Bento XVI e o então cardeal Jorge Bergoglio, o futuro Papa Francisco. Diálogos pessoais não poderiam ser gravados ou documentados por terceiros. Aqui começam as mentiras. Depois é evidente a preocupação do redator em realçar a suposta empatia entre os dois personagens, rotulando ao primeiro como “incapaz de dialogar com o mundo” e ao segundo como “mente aberta e revolucionária para as reformas necessárias dentro da Igreja”. A contraposição é pano de fundo para a surpreendente renúncia de Bento, que supostamente tramou e articulou a escolha de Francisco. Como se a ação do Espírito fosse apenas uma carta marcada e bem planejada anteriormente. A esse respeito, muito bem disse o bispo espanhol D. José Ignacio Munilla: “Tudo isso tem um objetivo que está absolutamente a serviço da heresia de nossos dias, que é a contraposição entre a verdade e a caridade, que se apresenta de uma maneira recorrente”. Bento XVI seria o amante do radicalismo exigido pela Doutrina, representado aqui pela fidelidade aos dogmas, à verdade e à fé, conquanto Francisco  seria um forte inimigo das posições de seu antecessor, que defenderia uma maior abertura da Igreja à realidade do mundo, condescendente com situações de homossexualidade, aborto, sacerdócio feminino, etc, etc… Eis a dualidade de posições sutilmente manipulada, capaz de mostrar aos incautos uma Igreja dividida. Esse é o risco de um filme isento do senso crítico. Ridicularizar nossa fé e nossas posições antagônicas. Simplesmente isso.

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]

 

 




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            Muitos há por aí ansiosos em mudar o mundo. Outros a questionar a obra da Criação, como se o Criador mil erros tivesse cometido. Outros ainda a se por como deuses e traçar outros rumos, mais objetivos, perfeitos, sem os males da convivência humana, sem as agruras do trabalho pela sobrevivência ou das dores e provações de uma existência precária, transitória, fugaz. Por que a morte, doenças e fome? Por que tantas privações a pontear uma vida? Por que isso, por que aquilo? Todos, enfim, teriam seu dedinho de participação num projeto criativo bem mais ditoso e perfeito do que este que nos circunda e do qual bem conhecemos suas mazelas e defeitos tantos.

Bem nos disse o escritor brasileiro Monteiro Lobato, aquele criador de tantas e tantas aventuras num sítio onde reinava um Narizinho atrevido e uma boneca cheia de ideias novas e fantasias mirabolantes. Onde Pedrinho era tão somente um diminutivo de muitos Pedros, Joões e Marias que povoam as aventuras desse mundo encantado que denominamos casa comum. Nesse sítio morava Américo, que tinha o hábito de por defeito em tudo. Não é que até num pomar paradisíaco percebeu algo errado. Onde já se viu tamanha contradição da natureza, como aquela que observou numa plantação de abóboras e num pé de jabuticabas. Por que uma árvore tão frondosa a produzir frutos tão pequeninos enquanto uma planta rasteira e frágil produzia enormes abóboras, que se misturavam ao pó da terra? Não seria mais lógico abóboras em árvores e jabuticabas à rês do chão? Assim aquele Américo que pensava ter descoberto a América, deitou-se à sombra da frondosa jabuticabeira, sonhando com outras mudanças no curso da Natureza.

Eis que, de repente, uma pequena jabuticaba lhe cai no rosto. Desperto de seus projetos inovadores, suspirou dizendo: “Ainda bem que não foi uma abóbora. Pois se o mundo fosse arrumado por mim a primeira vítima teria sido eu. Eu, Américo Pisca-Pisca (era esse seu apelido), morto pela abóbora por mim posta no lugar da jabuticaba? Hum! Deixemo-nos de reformas. Fique tudo como está, que está tudo muito bem”.

A lição lobatiana nos remete aos abusivos projetos de muitos, quando colocados acima e adiante do projeto inicial de Deus. O ato da criação foi perfeito e continua sendo em todos os seus nuances, objetivos e projeções no tempo e no espaço estipulados por Ele. A Perfeição do que é Divino não aceita remendos, nem mudanças, nem implantes. “Deus viu que tudo era bom!” Então, como ficamos? Nossa participação nesse projeto é de continuidade, de aprimoramento para tudo aquilo que nos conduza à vida, aperfeiçoe e aumente nossas expectativas de vida, aumente nossos conhecimentos e definições de sua plenitude, nunca da morte e sua finitude. Projetos de vida ignoram e se contrapõe aos projetos de morte. Vida é graça, dádiva divina. Morte é pecado, cegueira humana. Portanto, se desejarmos a continuidade desta, a perpetuação de nossa história como frutos semeados num Paraíso, cada qual a seu tempo e em seu lugar, não podemos enxertar nossa existência fora do projeto inicial que Deus nos traçou. Cada um com sua história e no seu próprio espaço. Como abóboras ou jabuticabas, grandiosos frutos em rama frágil ou pequenos e saborosos frutos em árvores frondosas. Não importa. Todos aqui estamos para realizar um projeto perfeito, um plano existencial agradável a Deus e aos olhos Dele, nunca dos homens. Faça sua parte. Esqueça as ilusões facciosas daqueles que querem mudar o mundo, mas não se aceitam como realmente são. Não aceite enxertos em sua vida. Siga os Planos de Deus para si. Seja você uma abóbora maravilhosa ou uma jabuticaba tenra e doce.

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]




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ELE ESTÁ VOLTANDO

Em tempos de mudanças e expectativas, como em qualquer final de ano, o coração humano se enche de planos e sonhos renovados. Natural e positivo tal comportamento. Como também natural e positiva a renovação espiritual daqueles que acreditam na força interior de suas opções religiosas. Especialmente para aqueles que vivem uma espiritualidade encarnada e conflitante com o mundo. Um mundo cada dia mais agnóstico.

Posto esse cenário, vem a questão: Como viver a fé em meio à descrença de muitos? Para nós, cristãos, essa é nossa prova dos nove, ou seja, o destemor e a alegria devem ser nossas características primeiras. Desafiar o mundo com espadas ou ironias não são armas apropriadas para quem se diz (ou ao menos tenta ser) um emissário da Paz que vem do alto. As armas do cristão são suas mãos vazias, estendidas na ação de solidariedade com o próximo ou unidas em louvor constante às dádivas que vem dos céus. Mãos que se usam na ação e na oração.  Não nos competem os argumentos da força, da coação, da discórdia, da violência ou do ódio, comuns entre aqueles que ignoram os princípios básicos da fraternidade que sonhamos. Se o mundo rejeita esse caminho, lembra-nos que por primeiro já rejeitou aquele que se fez o Caminho, Verdade e Vida. Mas Ele está voltando…

Por uma dessas ironias que a realidade aparentemente oposta faz aos princípios da fé cristã, um irmão missionário escreveu-me o seguinte texto, nesta semana: “Já vi jovens usando camisetas com a mensagem ‘Lúcifer está voltando’. Se existir blasfêmia maior contra Deus, essa é uma delas”. Obrigado Adroaldo. O pior não é o anúncio de uma possível e gloriosa volta demoníaca, pois esta acontece deste o princípio da nossa história. Lúcifer sempre esteve conosco, nunca nos deixou. Essa é a verdade. Mas também é verdade que sua ação no mundo se intensifica de quando em vez. Como nos dias atuais. Lúcifer está deitando e rolando entre nós. E, por certo, dando boas e terríveis gargalhadas.

Todavia, o Advento cristão renova nossas esperanças. Contemplar um Cristo menino numa manjedoura é alimentar as expectativas de um mundo melhor à luz das promessas de Deus. É contemplar a simplicidade e a grandiosidade da Promessa. E essa também é textual em nossas vidas: “Ele será grande e chamar-se-á Filho do Altíssimo… e o seu reino não terá fim” (Lc 1, 32-33). Não há o que temer diante da solidez dessa promessa. Não só nos dá certezas de vitória, como também enche nossos corações de alegrias e esperanças redobradas. “Ainda um pouco de tempo, e já me não vereis; e depois mais um pouco de tempo e me tornareis a ver”. (Jo 16,16). Não podemos limitar esse espaço de espera ao tempo já passado (em especial aqueles três dias de morte e ressurreição), nem à promessa de “um advogado” o paráclito a defender nossas causas, mas também e principalmente à sua volta gloriosa “a julgar os vivos e os mortos”, a fazer a justiça que almejamos com ansiedade…

Então a injusta perseguição, incompreensão, intolerância e cinismo do mundo contra os princípios cristãos cairá por terra. Porque fomos resgatados ao preço da dor. Porque “outrora éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor: comportai-vos como verdadeiras luzes” (Ef 5,8). Porque, mesmo diante de uma realidade antagônica ao que imaginamos e sonhamos ou à aparente decepção humana diante da Criação divina, aquela em que Ele só viu perfeição, nossa esperança ainda é maior e mais sólida. O caos nunca existirá para quem espera e confia. Porque Ele voltará triunfante, num novo Natal de luzes. E seu Reino não terá fim.

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]

 

 




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SER e ESTAR são muito mais do que dois verbos com terminações e significados diferentes. Ser e estar comportam a vida em sua complexidade. O verbo ser define existência (ontológica e inequívoca). O verbo estar define estado (circunstancial e transitório). Enquanto o verbo ser trata de questões relacionadas à existência: identidade, verdade, unicidade, verdade e personalidade de um determinado indivíduo, o verbo estar trata de questões relacionadas à sua condição no tempo e no espaço: estar doente, indisposto, triste, nervoso, vestido, longe…

Quando falamos que isto ou aquilo é; que este ou aquele é estamos fazendo afirmações que dizem respeito a tudo aquilo que ultrapassa o tempo e os momentos, o espaço, e as circunstâncias. Diferentemente, quando dizemos que isto ou aquilo está, este ou aquele está estamos fazendo afirmações sobre uma situação ou circunstância na qual se encontra; como algo transitório; como algo passível do tempo. Não demora muito e a circunstância muda.

Trazendo para bem perto de nosso dia-a-dia, ser e estar abrangem um universo de compreensão bastante largo que traduz as relações interpessoais, motivações interiores, ações, necessidades, poder, desejos, vontades, realizações conosco mesmo, com os outros, com Deus e com o mundo.

No mundo, nada e nenhum de nós é o que é por um tempo apenas ou por um momento. O ser de qualquer pessoa ou coisa diz respeito à sua própria vida e existência; diz respeito à sua essência e à sua verdade mais profunda, sempre, acima das circunstâncias. Isso é uma questão de autenticidade. É verdade que tudo o que existe está voltado para algo ou alguém; é marcado e deixa sua marca; influencia e deixa-se influenciar. O ser das pessoas ou coisas está ligado à sua origem; é uma condição inata; pertence à sua gênese. Entretanto, não dá para falar do que algo ou alguém é sem nos referirmos a como, quando, onde, quem, porque, para que e com quem está e faz.  Só o que é pode estar e fazer. O estar-fazer acompanha o ser! O ser ‘pede’ o estar e o fazer, para se tornar visível aos outros.

Na Bíblia, a expressão DEUS-CONOSCO, como profecia de Isaías (Is 7,14) e anúncio de Mateus (1,23) traduz em termos bem concretos o ser de Deus em sua presença e obras no mundo e nas pessoas. O que sabemos de Deus e dele podemos entender nos é dado por sua presença e obras. Tudo de Deus se reflete em nós, como num espelho. Assim, Deus é conosco e nós somos com Deus.

Ao estar presente e ao realizar sua obra em nós e no mundo, Deus comunica o seu ser. Assim, marcados por Deus, tudo e todos, expande a sua própria existência, revelando o ser de Deus em seu ser. Nem as coisas e, nem tão pouco, nós nos revelamos como deuses, mas, sim como divinos: humanos e divinos.

Da mesma forma como na fé, estamos marcados pelos nossos genitores. Somos um pouco de nossos pais, sem nos confundirmos com eles. Somos a genética dos nossos pais, mas, estamos revestidos do nosso próprio ser. Nós só nos relacionamos como família porque há uma comunicação silenciosa de parentesco que nos aproxima, nos liga e nos faz ser pais, filhos, irmãos, primos, tios, avós… Por que somos pessoas, mesmo não sendo parentes, nos comunicamos como amigos, namorados, associados, companheiros… O que há de humano em nós ‘toca’ o que há de humano no outro e nos aproxima e nos interliga.

Nós só alcançamos as coisas do alto e só somos alcançados por Deus porque em nós, algo de divino ‘reclama’ o divino que há em Deus. Por isso, ser cristão, ser bom, ser humilde, ser fiel… não é algo que esteja na periferia de nossa vida, mas, no mais profundo de nós todos. Pertence ao nosso ser. Ninguém é o que é por algum tempo apenas. Não se pendura o que se é no cabide e nem se deixa em stand bye, por conveniência do momento ou da ocasião. O que nós somos o somos para sempre

A verdade do Natal de Jesus, como presença e ação de Deus no mundo, encontra um forte eco em nossa vida quando questiona a autenticidade de nossa existência na busca de superação de qualquer contradição que possa existir em nosso ser-estar-fazer. Que nenhum de nós precise do recurso do camaleão que se disfarça, mudando sempre de cores. Na natureza, o mimetismo é uma questão de sobrevivência. Nós não precisamos de disfarces: ou somos, ou não somos.

PE. EDIVALDO PEREIRA DOS SANTOS




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Com tantos acontecimentos negativos no mundo; com tanta violência; com tanta desumanidade, principalmente as que podemos constatar à nossa volta, corremos o sério risco de desacreditar nas pessoas, na gente mesmo, em Deus, na comunidade, no bem, na verdade, no amor, na fé… na justiça. Parece que não vale mais a pena! Se isso começou a ser sugerido em seu coração, fique atento. Você é um forte candidato ao posto de crítico-omisso-derrotista, que permite a multiplicação dos acontecimentos pelo mundo, a banalização da violência, e o crescimento da desumanidade, principalmente, à sua volta.

É verdade que muita coisa não está bem. Pior, ainda, algumas estão indo de mal a pior, fazendo a vida perder a graça. Mas, e daí? O que vai resolver cruzar os braços e dizer: ‘já fiz minha parte!’ ou ‘tô nem ai!’ ou ‘tem jeito não!’ ou ‘…’

Precisamos voltar a acreditar! O grande mal do mundo é que, pouco-a-pouco, tem-se deixado de acreditar nas pessoas, em si mesmo, em Deus, na comunidade, no bem, na verdade, no amor, na fé… na justiça.

E, por falar em justiça que tal reinventarmos a sua força como de um broto? Quando, por ocasião de uma semeadura ou até mesmo de uma raiz se permite à semente ou à planta o tempo do broto, certamente, não faltarão frutos.

Todos os dias externamos nossa insatisfação com a justiça humana, muitas vezes, criticada como cega, impotente, cúmplice, corruptível… Se a nossa decepção com a justiça humana está relacionada à impunidade, à morosidade e parcialidade da lei, ao invés do desencanto com a lei, deveríamos refazer o ideal de justiça como broto, nas pequenas coisas, nos pequenos gestos, nas escolhas, nas decisões, nos compromissos e nas posturas que assumimos dia-a-dia.

Um broto é explosão de vida e pura expressão de desenvolvimento que contrasta com sua enorme fragilidade e delicadeza. Broto é esperança, é oportunidade. O Broto faz justiça à semente e os frutos fazem justiça ao broto.

A intuição bíblica do broto, como primeira imagem do que se espera da semente, em vista dos frutos, nos coloca, imediatamente, diante da cotidiana responsabilidade do ser, do crer, do querer e do fazer. “Amor e Fidelidade se encontram, Justiça e Paz se abraçam. A Fidelidade brotará da terra, e a Justiça se inclinará do céu. Javé nos dará a chuva, e nossa terra dará o seu fruto. A Justiça caminhará à frente dele, a salvação seguirá os seus Passos” (Sl 85,11-14).

Na verdade, direta ou indiretamente, todos os dias, estamos colhendo frutos indesejáveis de uma justiça que não cultivamos, nem como semente, nem como broto. O problema da justiça não está nos tribunais, está em cada um de nós. Nos tribunais, quem sabe, temos de forma maiúscula aquilo que não percebemos ou não admitimos em nós. Como diz o ditado: “Vamos colhendo o que plantamos!” O que temos plantado?

A profecia sobre o rei justo e a emergência da justiça tem, em Davi, seu grande anúncio e, em Cristo, sua plena realização. “Do tronco de Jessé sairá um ramo, um broto nascerá de suas raízes. Sobre ele pousará o espírito de Javé: espírito de sabedoria e inteligência, espírito de conselho e fortaleza, espírito de conhecimento e temor de Javé. A sua inspiração estará no temor de Javé. Ele não julgará pelas aparências, nem dará a sentença só por ouvir. Ele julgará os fracos com justiça, dará sentenças retas aos pobres da terra. Ele ferirá o violento com o cetro de sua boca, e matará o ímpio com o sopro de seus lábios. A justiça é a correia de sua cintura, é a fidelidade que lhe aperta os rins. O lobo será hóspede do cordeiro, a pantera se deitará ao lado do cabrito; o bezerro e o leãozinho pastarão juntos, e um menino os guiará; pastarão juntos o urso e a vaca, e suas crias ficarão deitadas lado a lado, e o leão comerá capim como o boi. O bebê brincará no buraco da cobra venenosa, a criancinha enfiará a mão no esconderijo da serpente. Ninguém agirá mal nem provocará destruição em meu monte santo, pois a terra estará cheia do conhecimento de Javé, como as águas enchem o mar” (Is 11,1-10).

Eis o tempo de se abrir à justiça divina para poder sair do embaraço da justiça humana!

Os dias para a justiça florir são todos os dias de nossa vida e de nossa história, a começar de agora! “O Justo vive pela fé” porque “a justiça se revela única e exclusivamente através da fé” (Rm 1,17).

PE. EDIVALDO PEREIRA DOS SANTOS




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Não é o manto que faz o profeta (Mt 7,15), nem o hábito que faz o monge. Essa conhecida verdade nos faz pensar nos muitos lobos com pele de cordeiro que rondam nossas vidas. O manto de peles era a veste mais comum entre os profetas de profissão, tais quais Jeremias ou João Batista que se vestiam com simplicidade. João preferia a pele de cordeiros. O precursor do Cristo mesclou seu visual com a pele de suas ovelhas e isolou-se no deserto donde obtinha o mel silvestre e os gafanhotos, a doçura da plenitude espiritual e o mínimo de proteínas para sua sobrevivência física.

O que essas circunstâncias e condições nos revelam? Primeiramente, que o profetismo exige renúncia, abnegação, humildade e sacrifícios. Não é um mero ato de despojamento material, mas de aprimoramento do espírito a fim de se obter maior clareza para mentes sedentas da verdade. Não é um atributo exclusivamente místico, mas também filosófico e intelectual. Os grandes pensadores da história humana necessitavam e necessitam desses momentos de isolamento, para um melhor confronto com os mistérios que nos rondam. Portanto, o isolacionismo profético de João Batista foi esse confronto que a verdade revelada pela pessoa de Cristo exigiu em seu anúncio: “Endireitem as veredas, preparem o caminho, pois o Messias está chegando”!

Seu despojamento de tudo – até das vestes aparentes – nos ensina o quão grandioso e significativo é o encontro humano com a verdade cristã. A simples expectativa de sua vinda já provoca mudanças radicais entre aqueles que anseiam por Ele, o Messias. Antes, é preciso purificação, mudança de atitudes, conversão mesmo. Ou seja: não se recebe Cristo com os trajes do homem velho, a veste da corrupção, da usurpação, da ostentação, da vaidade, soberba ou tudo mais que simbolize ou represente a vergonha que encobre nossa vida pecaminosa. É preciso nos despir de nossos pecados, fazer-se nada, penetrar o deserto de nossas vaidades e dele retirar somente nossa essência, a fragilidade do que realmente somos. Buscar o essencial, o mel, a doçura de uma vida que se abandonou na Providência e na Misericórdia do Pai que nos proporcionou tudo o que temos ou somos.

Quem compreende esse comportamento profético e o aceita em sua vida vive seu próprio advento, um novo tempo de expectativas e mudanças. Isso nos ensinou o Batista. Isso é o básico de que necessitamos para melhor compreender e agradecer pelo milagre do Natal em nossas vidas. O novo tempo é seu desafio. Vestir-se com o manto de peles também é despir-se dos atributos de nossa vaidade pessoal, para melhor aceitar a dádiva divina oferecida na manjedoura de Belém. O hábito usual – aqueles panos que cobrem nossas vergonhas depois da descoberta de nossa nudez no paraíso – não nos fazem mais ou menos dignos diante das Graças que transbordam diuturnamente em nossas vidas. Basta nos desnudarmos em nossa essência diante Daquele que nos conhece por inteiro, que nos vê como realmente somos, que não nos pede mais do que somos capazes, que nos ama plenamente, apesar dos inúmeros falsetes que usamos para fugir de seus olhos, ignorar seus planos, negligenciar nossa vocação  profética e missionária.

Lancemos fora os panos que nos cobrem. São panos transparentes, incapazes de cobrir nossa vergonha diante de Deus. Antes, se quisermos realmente agradá-Lo e merecer a graça de contemplar seu rosto, compreender e aceitar as revelações que seu Filho nos trouxe, é preciso vestir nossa alma com o manto da simplicidade, da pureza profética das ovelhas que o Bom Pastor cuida e conduz pelas veredas da mansidão e da humildade. Troque de roupa. Mude seus hábitos.

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]

 

 

 




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Uma senhora rica e idosa sofria sérios problemas de uma paralisia que limitava há anos sua mobilidade. Ouviu falar de um possível santo padre capaz de lhe devolver os movimentos. Buscou-o como último recurso e dele recebeu uma simples bênção… Simples, mas poderosa, pois esta lhe propiciou a sonhada cura. Agradecida, retornou ao padre para presenteá-lo com um valioso bracelete de ouro, uma de suas mais preciosas joias. Mas, ah! razões que desconhecem a razão! O pobre padre recusou a oferta, pois não estava ali para se locupletar com riquezas advindas da generosidade divina. Que esta preciosidade material fosse oferecida à primeira pessoa que cruzasse o caminho daquela senhora, não a ele, um simples instrumento nas mãos de Deus!

Eis então que aquela mulher se põe a caminho da vida habitual, agora caminhando com os próprios pés, mas sem entender a rejeição de sua preciosa oferta. A primeira pessoa? Quem seria? Foi quando uma senhora negra, pobre e maltrapilha, cruzou seu caminho. Seria ela? Sim… Ou não? Não poderia ser. O que aquele rascunho de gente faria com seu precioso tesouro? Algumas míseras moedas lhes seriam suficientes, fariam sua alegria momentaneamente. Em vez de lhe dar o bracelete, a velha milionária estendeu-lhe míseros 5 réis que trazia consigo. Então nova paralisia interrompeu seus passos.

Essa é uma das mais populares narrativas dos muitos milagres atribuídos ao brasileiro Pe. Donizetti Tavares de Lima, vigário da pequena Tambaú, interior de São Paulo, que agora recebe a honra da beatificação, o primeiro passo para sua possível canonização e entronização definitiva na glória dos santos e santas do Povo de Deus. O milagre de Tambaú acima descrito é um entre centenas de outros, mas cuja singularidade faz parte até do cancioneiro regional, que ousa atribuir à personagem negra daquela misteriosa mulher a presença inquestionável de Nossa Senhora Aparecida, a Mãe Morena de todos os brasileiros. Mesmo assim, o grande milagre ainda continua sendo a figura do Pe. Donizetti, mineiro de Cássia (1882), mas paulista da gema… do coração sempre sensível às carências e necessidades dos trabalhadores que o procuravam em massa apenas para ouvir sua voz e receber suas bênçãos. Tambaú o acolheu durante a maioria de seus anos pastorais, que só se encerraram aos 79 anos (1961), enquanto dormitava em uma de suas velhas cadeiras, hoje uma de suas mais preciosas relíquias, a cadeira onde morreu Pe. Donizetti!

Três são os milagres mais comuns presentes em sua vida. Três dons só atribuídos aos maiores santos da fé cristã: a levitação, a premonição e bilocação. São muitos os testemunhos de seus paroquianos quanto às ocasiões em que o viram levitar, alcançando razoáveis distâncias do solo, durante seus sermões mais arrebatadores e impregnados da graça do Espírito Santo. Muitos desses paroquianos ainda vivem e atestam esses fatos. Outros comprovam o dom da premonição como fato corrente em sua biografia, pois foi capaz de prever e anunciar muitos desastres ou acontecimentos incomuns em sua época. Mas um dos dons que mais atraiu as multidões à pequena Tambaú (chegou a três milhões de pessoas em um único mês) era a inexplicável capacidade de estar presente a vários fatos e acontecimentos ao mesmo tempo. Foi visto em várias cidades administrando sacramentos ou bênçãos num mesmo tempo e ocasião. Como se lê, Pe. Donizetti não é apenas um vigário a mais a enfeitar a crença e a devoção popular, mas uma referência do poder e glória de Deus, capaz de suscitar e premiar seu povo com a vida de seus santos e santas, bem vivos entre nós e na história que ainda escrevemos. “Não faço milagres!” – bradava às vezes perturbado o vigário de Tambaú. E vaticinava: “Quem faz os milagres é Deus”!

          PS Tenho um irmão, nascido em 1954, que recebeu no batismo o nome de Donizetti, simplesmente porque meus pais, já naquela época, reconheciam a santidade deste padre.

WAGNER PEDRO MENEZES wagner@,meac.com.br




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Quando Fernando Sabino escreveu sua obra prima, não imaginou que uma simples menção à morte pudesse obter sucesso. Sua abordagem, mesmo que feita indiretamente, foi e ainda será tema central para tantas outras obras, muitas com títulos quase similares. Nenhuma delas, no entanto, enfoca o assunto com exclusividade, pois seria um “suicídio” de vendas.

João Mohama, em “O Encontro”, caminha pelas várias oportunidades do encontro humano com Cristo, princípio, meio e fim da existência. “Até hoje este princípio continua lei para todo homem e para toda mulher que vêm a este mundo”, diz. E encerra: “Ambicionando uma transformação sempre mais profunda, mais significativa, cada um de nós pode dizer: minha gota é meu mar. Se, pelo encontro com Cristo, eu oceanizar minha gota”. Ou melhor, se minha vida for além dela própria, emergir no oceano divino…

Já uma santa mulher, Terezinha do Menino Jesus, fez do seu dia a dia um contínuo refletir sobre o tema. Registrou tudo em um diário, que tornar-se-ia sua obra prima. “Não morro…entro na vida”. Dizia: “Supondo que o bom Deus me dissesse: Se morreres aos 80 anos, tua glória será menor, mas, em compensação, dar-me-ás um grande prazer… Oh! Então, eu não hesitaria em responder: Meus Deus, quero morrer aos 80 anos, pois não busco a minha glória, mas somente o vosso prazer…”

Outro aspecto do encontro que buscamos é aquele que se dá com os semimortos da estrada, os que oscilam entre a vida e a morte, tanto no aspecto espiritual quanto biológico. Pior de todos é o primeiro aspecto. Nesse estão grande parte dos que convivem conosco, senão nós mesmos muitas vezes. Sobre o assunto, Arturo Paoli escreveu: “Um encontro difícil”, no qual nos afirma que “o encontro com os assaltantes deixa o homem despojado de tudo e semimorto”. Eis um diagnóstico preciso da humanidade hoje. Quantos “assaltantes”, ladrões da esperança humana, que se postam à beira do caminho, fazem parte da nossa história! Mas seu fecho sobre o assunto é consolador: “Por isso Jesus vem ao encontro do homem, e não somente com um projeto, mas com uma dádiva de redenção”.

Todavia, voltando ao livro que hoje nos inspira, Sabino traz nele uma parábola preciosa. Não há melhor forma de encerrar um assunto. Era assim que Jesus marcava seus ensinamentos, contando histórias…

“Era uma vez um homem que procurava um seixo que virava qualquer metal em ouro”. Quem ainda não fez essa busca em sua vida? Quem nunca ambicionou riquezas fáceis e prazerosas, dessas que não custam mais que um simples e displicente caminhar pela vida? Pois nosso personagem “saiu por aí” observando as pedras pelo caminho, com as quais batia em sua fivela na esperança de encontrar aquela que o fizesse rico. “Um dia, depois de anos e anos de procura, já velho e alquebrado, sentou-se à sombra de uma árvore para descansar e distraidamente olhou para a fivela do seu cinto”. Tinha virado ouro. “Onde? Quando? Quer dizer que o seixo procurado estivera nas suas mãos!” Resignado, o velho recomeçou a busca.

Nosso encontro com Deus está marcado desde nosso nascimento. Não espere o fim de tudo, o “milagre” de uma revelação que mude tudo em sua vida. Às vezes ele já aconteceu e você ainda não se deu conta. Não o aguarde apenas na outra vida, onde riquezas imensuráveis lhe são prometidas. Recomece sua procura a cada amanhecer, no aqui e agora de sua existência.

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]

 

 




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A liturgia é uma grande escola de espiritualidade, é a alma da Igreja e o alimento para a fé porque permite celebrar as ações e presença de Deus na história. Sem liturgia a história é, apenas, ciência humana que estuda o desenvolvimento do homem no tempo; que analisa os processos históricos, personagens e fatos para poder compreender um determinado período histórico, cultura ou civilização.

Lendo a Palavra de Deus, cada dia, vamos entendendo o Mistério de Cristo em nossa vida e o chamado de conversão que ele nos faz. A Liturgia nos coloca dentro da história do mundo e da história da salvação.

A compreensão geral, sobre a história e seus processos, como já disse, baseia-se em personagens e fatos, numa determinada época e em meio a circunstâncias muito precisas. É assim que a ciência se preocupa com a história e a interpreta.

O dia-a-dia do ‘comum dos mortais’, longe dos livros, das pesquisas, das hipóteses e da ciência, mostra uma compreensão de história bem localizada no aqui-e-agora, baseada nas dores e alegrias daquele momento; nas derrotas e glórias daquela hora; nas desconfianças e segurança daquele instante; nos anseios e esperança daquele tempo. É uma compreensão de história muito circunstancialista, as vezes, sem perspectivas e, até mesmo, determinista. A tal ponto que, ao invés de uma postura de luta, de escolha, de decisão, de abertura e compromisso diante da vida, vê-se, ao contrário, as pessoas entregues ao pessimismo derrotista que pensa a vida como um beco sem saída; que não acredita em solução para os males; que não se interessa pela união dos esforços; que não vê melhora em nada…

A fé ensina a ver a história com outros olhos e ajuda a corrigir qualquer distorção sobre o que devemos fazer e esperar. De fato, não existem duas ou mais histórias. São as interpretações que são múltiplas. Na verdade existe uma só história, a História da Salvação, na qual nós vivemos, nos movemos e somos guiados por Deus, para um ponto bem definido: o Reino de Deus.

A fé nos ajuda a manter os pés na corrida da vida, com os fixos em Jesus (Hb 12,2). E, para não nos tornarmos um peso para ninguém (1Ts 3,8) e, nem tão pouco, dados à injustiça (Ml 3,19), somos chamados a permanecer firmes. Porque, é permanecendo firmes que ganhamos a vida (Lc 21,19).

O Livro do Profeta Malaquias, oferece-nos questionamentos importantes sobre a vida na fé e iluminações importantes de como manter-se na perspectiva da história da salvação.

Ml 1,2.6-8: “Javé diz: ‘Eu amo vocês’. E vocês perguntam: ‘De que jeito nos amas?’ Um filho honra o pai e um escravo honra o seu senhor. Se eu sou pai, onde está a honra que me é devida? Se eu sou senhor, onde está o respeito que me é devido? (…)

Ml 3,13-18: “Vocês usaram palavras duras contra mim – diz Javé. Vocês perguntam: ‘O que é que foi que falamos contra ti?’ Vocês disseram: ‘É inútil servir a Deus. Que proveito a gente tira em guardar os mandamentos dele ou andar vestindo luto frente a Javé dos exércitos? Esses, diz Javé dos exércitos – quando eu resolver agir, serão a minha propriedade particular. Então vocês hão de se converter e verão a diferença que existe entre o justo e o ímpio, entre um que serve a Deus, e outro que não lhe serve.”

Ml 3,1-5: “Vejam! Estou mandando o meu mensageiro para preparar o caminho à minha frente. De repente, vai chegar ao seu Templo o Senhor que vocês procuram, o mensageiro da Aliança que vocês desejam. Olhem! Ele vem!”

Ml 3,19-24: “Vejam! O Dia está para chegar, ardente como forno. Então os soberbos e todos os que cometem injustiça serão como palha. Quando chegar o Dia, eles serão incendiados – diz Javé dos exércitos. E deles não vão sobrar nem raízes nem ramos. Mas para vocês que temem a Javé brilhará o sol da justiça, que cura com seus raios. E vocês todos poderão sair pulando livres, como saem os bezerros do curral.”

 

PE. EDIVALDO PEREIRA DOS SANTOS




Diocese de Assis

Ecumenismo é uma palavra difícil, que diz respeito à mais vergonhosa contradição da fé cristã: a separação. Às vezes é mais fácil usá-la para justificar ações de diálogo com as religiões não cristãs, deixando de lado a grande trave de nossos olhos, a cisão entre os adeptos de uma mesma fé.

Desde o movimento reformista de Lutero, cujas razões e causas aqui não serão motivo de nossa análise, vários foram os esforços e tentativas de reaproximação entre as Igrejas cristãs. Até dois Concílios se denominaram ecumênicos! Vários pontífices católicos se mostraram abertos a essa busca de unidade. No entanto, a cada passo de reaproximação, parece-nos, dois outros são dados em direção oposta. O que nos falta para apagar essa mancha pútrida e nauseante da história do cristianismo?

A Paz entre os humanos passa pelo testemunho de unidade entre os cristãos. Existe a permanente necessidade de diálogo cultural, racial e religioso – pedestal da paz que sonhamos – mas nos quedamos diante de gritante contradição: a “guerra” entre cristãos. Nunca seremos construtores da fraternidade ou solidariedade se, antes, não as edificarmos entre nós, buscando a qualquer preço a unidade cristã, o mais precioso testemunho de fé que a Igreja de Cristo pode oferecer ao mundo. Sem ela, estamos jogando pérolas aos porcos.

Dentre as raras ações de diálogo ecumênico dos últimos anos, podemos citar Taizé, na França. Em 1940, um jovem calvinista, Roger Schutz, se instalou naquela pequena aldeia, ao norte de Lion, para uma vida devotada a Deus. Sua experiência atraiu outros jovens, de várias denominações cristãs. Logo eram centenas, todos buscando uma vida comunitária e de acolhimento aos espoliados ou refugiados de guerra. Lenta, mas perseverantemente, foram vencendo resistências da Igreja católica e das Igrejas protestantes. O testemunho falava mais alto. Em 1970, já congregando milhares de jovens no mundo, realizaram seu primeiro concílio. Em 1974 assustaram a França e o mundo com o poder de aglutinação que possuíam. Nada menos do que 45 mil jovens tomaram as colinas de Taizé, como representantes de mais de cem países e dos cinco continentes. A mídia se surpreendeu não só pelo número de participantes, como também pela euforia, paz e cordialidade reinantes entre eles.

Desse encontro surgiu a “Carta ao Povo de Deus”, eivada de desejos de reaproximação e unidade, respeitando-se as eventuais diferenças. Eis um de seus mais belos trechos: “Igreja, que dizes tu do teu futuro? Vais renunciar aos meios de poder, aos compromissos com os poderes políticos e financeiros? Vais chegar a ser uma semente de sociedade sem classes e sem privilégios, sem dominação de um homem sobre o outro, de um povo sobre o outro?”.

Em 1978, oito anos depois do primeiro concílio de Taizé, um balanço da então mais expressiva caminhada ecumênica produziu uma conclusão de esperança. “Durante estes oito anos, compreendemos melhor que amar Cristo é amá-Lo ao mesmo tempo no seu corpo que é a Igreja. E amá-lo não com palavras, mas pelo empenhamento de todo nosso ser. Com efeito, quanto mais vamos às fontes de vida cristã na contemplação do Cristo, tanto mais nós somos levados a procurar atos para realizar no concreto das nossas vidas”. A unidade era o ato mais concreto. Taizé taí. Deixo abertas as portas do diálogo. Afinal, faltam ações, gestos concretos, desprovidos de falsetes, farisaísmo ou cartas marcadas. O mundo está aberto à simpática e maravilhosa proposta que nos deixou Jesus: “Amai-vos uns aos outros”. Onde está nosso testemunho?

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]