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Diocese de Assis

 

Está no ar a magia da revelação cristã, embrulhada como presente numa manjedoura de animais, num curral quase sempre fétido e improvisado. Está no ar o que deveria ser a maior e mais bela das festividades humanas; não mais o  é. O que fizemos do nosso Natal? A resposta exige tato e sensibilidade, que só a alma serena e devota de um poeta é capaz de nos dar com certeza e precisão: “É Natal, a partilha é possível, necessária, mudará tudo”. Obrigado, companheiro das desilusões e da esperança renovada. Natal é muito mais do que a festa da hipocrisia e do farisaísmo que a domina. É nossa oportunidade de redenção.

Então, o que faremos? Por enquanto, na ala dos desentendidos estão muitos dos burrinhos dos nossos presépios ou das vaquinhas sonolentas e indiferentes ao milagre que acontece diante de seus olhos. Veem, mas não enxergam. Tristes estes, que fazem da noite divina um hiato do tempo, a ruminar sonolentamente seus dias e ignorar os sinais de um novo dia que vence as trevas e prepara nova aurora de vida e esperança. De burrinhos e vaquinhas de presépio temos muito.

Mas há aqueles que se deixam representar pelos inesperados e curiosos visitantes de primeira hora, extasiados que estavam com o clarão de uma luz a iluminar aquela noite mágica. Diziam-se pastores, operários sempre atentos aos sinais de perigo e alerta contra as ameaças dos lobos e coiotes a rondar seus rebanhos. Onde estão estes agora? O que fizeram da magia daquela noite aureolada pelo solstício de uma revelação divina? Um deles trazia nos ombros uma ovelha perdida, desgarrada ou, quiçá, ferida no caminho. Aquela ovelha lhe representa?

Perguntas por perguntas, já vemos o limiar dos reinados terrenos a caminho do berço improvisado. Trazem também presentes. Porém muito mais simbólicos do que os que oferecemos hoje, na onda do consumismo que dominou esse momento cristão. Ouro, ilusão do ouro! Incenso como nossas loas voláteis e passageiras! A mirra de nossos amargores, falácias, decepções! Eis o que temos para oferecer; eis tudo o que hoje depositamos no altar da fé que pensamos ter…

Cadê o ouro verdadeiro, a riqueza maior que poderíamos colocar naquele berço casto e sagrado? Quem ali é capaz de oferecer seu único tesouro que nenhuma ferrugem ou ácido da indiferença mundana seja capaz de corroer, consumir? Quem se dispõe a oferecer a vida, o mais precioso dos tesouros que um dia recebemos de Deus?

Mas há também o simbolismo do incenso, esse que é capaz de se elevar de nossos corações com o perfume casto e suave de nossa gratidão. Nossas orações ganham essa dimensão sagrada, quando elevada aos céus com a pureza e simplicidade de uma fé transformadora, saudável, reluzente como qualquer alma generosa e complacente. Saibamos incensar o menino que nasce diuturnamente em nossos corações, agraciados por sua presença.

Por fim, saibamos também presenteá-lo com a mirra, a essência da profilaxia que nos cura e liberta de todo mal. O santo remédio do arrependimento e da purificação que nos prepara a alma para viver intensamente com a saúde espiritual de que tanto o mundo precisa. Quando soubermos valorizar esse espírito natalino com o respeito que ele merece, teremos a resposta aos dilemas e problemas que hoje temos. E a pergunta será: O que mais poderemos fazer?

                             WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]




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Quantas vezes ouvimos falar da história das virgens previdentes e não previdentes, que buscavam as graças de um noivo? Quantas vezes aprofundamos essa história, sem nunca a entendermos plenamente? Pois é essa exatamente a parábola das almas sedentas pelo encontro definitivo com Deus, a maior e mais pura aspiração da natureza espiritual do ser humano. Essa é a razão do nosso existir. Para perfazer esse caminho é preciso manter acesa a chama da nossa fé, trazer conosco o combustível necessário que clareia os passos dos que almejam (almejar vem de buscar com a alma) as alegrias do Reino entre nós.

Recordando em suma: Jesus coloca nessa história o exemplo de dez virgens. Cinco eram previdentes, cinco não. As previdentes traziam consigo o óleo necessário para manter acesa a chama de suas luzes. Sabiam que, no cair da noite, nas horas derradeiras do dia mais sonhado de suas existências, haveriam de reconhecer mais facilmente o noivo que vinha e que as receberiam de imediato sob o brilho de suas luzes. Haveriam de brilhar para Ele. Seriam a luz do mundo em trevas. Já as imprevidentes, sem preocupações maiores, sem critérios de um caminhar longe das trevas que as encobriam, pois que “o noivo estava demorando e todas elas acabaram cochilando e dormindo”, foram surpreendidas com a falta de óleo em suas lâmpadas. E encontraram fechadas as portas do Reino. Nisso resulta nossa imprevidência com as coisas do alto, as questões do ser espiritual que somos!

Fica, pois, bem evidente a simplicidade dos ensinamentos cristãos, cuja racionalidade está centrada no objetivo do nosso existir: ser luz do mundo! Ser sinal de salvação no meio das trevas que nos encobrem, da noite longa e tenebrosa dessa vigília na espera do “noivo” que chega, que aparentemente parece demorar, mas que há de chegar no momento que menos se espera. Não há como improvisar esse momento, essa festa “de casamento” que Deus nos prepara como encontro definitivo num mundo novo com o qual sonhamos. “Senhor! Senhor! Abre-nos a porta!” (Mt 25, 11) Esse é o brado mais retumbante da humanidade, mesmo que muitos ainda estejam indiferentes e achem ser possível “comprar o óleo” da salvação no momento final, no último instante de suas vidas. Não há como garantir esse momento, “pois não sabeis qual será o dia nem a hora”, e a conquista do Reino Definitivo se inicia no agora do nosso existir. Quem quiser garantir seu lugar ao Sol, sob a Luz da verdade que nos rege neste mundo, deve estar atento, diuturnamente, pois que a vigilância constante é nossa única garantia, nosso passaporte para a Eternidade.

Tudo isso resume nosso existir, dá sentido à vida. Não é mera pregação de fanáticos ou beatos confinados em crenças escatológicas, adventícias. Há um outro lado nessa história, que todos respeitamos, mas nem todos o fazem por merecer. A previdência de grande maioria está centrada apenas no seu aspecto social, nas falácias de uma aspiração meramente transitória, essa crença humana que diz ser a vida uma instituição de momentos, de circunstâncias, de fatos plausíveis e palpáveis. Melhor não pagar pra ver. Melhor manter acesa a chama da nossa fé.

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]

 

 




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Toda a vida cristã está baseada no modelo de vida do Cristo: suas ações, suas palavras, seus sentimentos, seus pensamentos, seus gestos, sua postura, sua mentalidade, sua sabedoria, seu amor, sua compaixão, sua misericórdia, seu perdão, sua ternura, sua percepção, sua sensibilidade, seu zelo, sua atenção, sua verdade, sua sinceridade…

O cristianismo, portanto, não é, simplesmente, uma ideologia, mas, um ideal; não é uma doutrina, mas, um itinerário de vida; não é uma convenção, mas, uma convicção; não é crença, mas, é fé.

Neste sentido, cristão é aquele que, identificado com o Cristo, se con-figura a ele. Isto é, torna-se um outro Cristo; sem deixar de ser o que é, assume, como sendo seu as ações, as palavras, os sentimentos, os pensamentos, os gestos, a postura, a mentalidade, a sabedoria, o amor, compaixão, a misericórdia, o perdão, a ternura, a percepção, a sensibilidade, o zelo, a atenção, a verdade, a sinceridade… do Cristo. A esse respeito, Tomas Kempis, no passado (1441), falava em Imitação de Cristo. O Evangelho fala de ser santo como o Senhor é Santo. Não são duas verdades que se excluem, mas que se completam. A prática da fé, pela imitação do Cristo, faz chegar à santidade. E santidade deve ser o escopo (meta) da vida.

Ora, quando muita gente pensa que a busca de santidade anula a natureza humana, como fazer da santidade uma meta sem se tornar desumano consigo e com os outros?

É preciso ter claro que, a santidade não desumaniza a pessoa, pelo contrário, totaliza, completa, plenifica. Porque o ideal de santidade pressupõe a realização da pessoa total e não de uma parte dela.

O grave problema de quem considera a busca da santidade como um risco à humanidade de uma pessoa, é a visão compartimentada e fragmentária de tudo.  Ora, quem fragmenta tudo, enxerga tudo através da limitada condição dos fragmentos. De tal forma que a referência de valor, de sentido, de verdade… será sempre pequena.  Por exemplo: quem não vê o tempo para além de um só dia, vai querer tirar proveito de tudo só naquele dia; quem não vê a fome para além da comida, não vai passar de um comilão; quem não vê o trabalho para além do dinheiro, vai continuar sendo um escravo remunerado; quem não enxerga o dinheiro para além do possuir, não vai deixar nunca de ser materialista; quem não enxerga o sexo para além do prazer, nunca resolve as suas obsessões e desvios.

O ideal cristão de santidade pressupõe a natureza humana: suas fraquezas e forças; suas limitações e grandezas, suas contingências e necessidades; seu nada e seu tudo…

Na fé, a visão de homem total (santo) é a de homem Feliz. E isso só é possível fazendo coincidir felicidade com santidade, santidade com realização e realização com prazer.

O grande desastre da vida humana é que, uma inversão, arbitrada pela fragmentarismo, coloca o prazer como princípio de tudo. Nisto está a derrocada do homem porque o hedonismo faz ponte com o individualismo, com o materialismo, com o egoísmo e com muitos outros “ismos” que esvaziam e escravizam.

As bem-aventuranças de Jesus, em Mateus 5,1-12, oferecem um programa de vida, onde o ideal de felicidade é a realização da pessoa em sua totalidade. Tomando como ponto de partida as realidades não negadas (mas assumidas) da vida, mostra como é possível ser feliz. A proposta, presente ali, é de felicidade e, não simplesmente de alegria.  Porque alegria é sempre algo passageiro; vem e vai rápido. A Felicidade, ao contrário, é algo mais duradouro e precisa de mais tempo para se consolidar para se tornar realização. Porque ela pode chegar não só através de uma alegria, mas também de uma tristeza.

Bem-aventuranças! Vale a pena conferir LENDO-AS e TRAZENDO-AS para a vida.

PE. EDIVALDO PEREIRA DOS SANTOS 




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Desde que o mundo é mundo, o conflito humano tem sido sua marca registrada. A história raramente foi um mar de rosas, pois que suas guerras e contradições sempre estiverem presentes aqui e acolá. Dessa forma, parece-nos que a luta pela sobrevivência tem em seu bojo a necessidade do combate corpo a corpo e as guerras tornam-se uma necessidade natural de se escrever essa história narrando as vitórias e conquistas dos que podem mais. Como se a glória fosse mérito dos mais fortes. Como se a purificação estive sempre do lado dos poderosos. Como se o direito à vida fosse um contínuo processo seletivo só concedido àqueles que cantassem vitórias no campo de batalhas.  Assim, de uma guerra à outra, de uma bomba aqui, um morteiro ali, um massacre ao lado ou uma invasão mais além, vamos construindo nossa história com o direito de pisotear os mais fracos. Essa é a razão de qualquer guerra. Esse é o conflito existencial que escrevemos, ontem, hoje e sempre!

Então toda e qualquer guerra é justificável? Esse é o perigo maior que molda a opinião pública quando declaramos nossas guerras. Primeiramente se estabelecem as razões. Depois o lado, o posicionamento pró ou contra, a necessária divisão de forças. Então, seja o que Deus quiser! Mas Deus não quer nada disso, ao contrário, Ele é  e sempre foi o mediador de todo e qualquer conflito. Tanto que Jesus, o Príncipe da Paz, foi bem claro e suscinto em sua promessa de recompensa aos que buscam a santidade em meio às contradições da vida humana: “Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5,9). Aqui não se encontra espaço que justifique uma situação a favor de qualquer tipo de guerra ou conflito armado. A paz é antes o único caminho capaz de nos promover e devolver à raça humana a dignidade de “filhos”, a razão maior e mais gratificante daqueles que buscam e encontram seu vínculo consanguíneo com o Criador. Ser elevado à categoria de filhos de Deus é a maior glória, a vitória suprema que justifica qualquer renúncia ou sacrifício em favor da paz.

Quando, pois a Igreja se posiciona contrária a qualquer tipo de guerra, não está tomando partido a favor deste ou daquele lado. Não é o Papa um mediador de conflitos, nem um negociador da paz em favor do mais fraco, como muitos possam pensar ou dizer. A bandeira cristã não tem cor. É branca como a pureza de uma alma sem segundas intenções, senão o ideal do Reino de Deus entre nós. Não vamos colocar nas declarações da Santa Sé as divergentes opiniões que as Nações Unidas deixam escapar com o veneno da parcialidade que forja nossas justificativas. A opinião dos que constroem a Paz não tem lado, nem cor, nem raça, nem crença. Por isso muitos não compreendem o lado neutro dos que se posicionam contrários a qualquer tipo de conflito. Buscam por primeiro o diálogo, a moderação, a cautela. São incompreendidos e injustiçados, mas também é na retidão desse posicionamento que a Igreja estende seu manto de Mãe e Medianeira entre Deus e os homens. Porque, como Igreja que somos, ainda podemos ouvir de seu Mestre e Senhor: “Bem-aventurados sois vós quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo tipo de mal contra vós por causa de mim” (Mt 5, 11).

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]

 

 




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Dia 18 de outubro foi o dia de São Lucas e, por conseguinte, dia do médico. Mas, quem afinal de contas, é o médico? Como o vemos? O que dele esperamos? Como o tratamos? Quando o procuramos? Somos amigos ou apenas clientes dos médicos? Em todas as profissões existe negligência. Tal fato compromete ou justifica as nossas constantes generalizações? Sabemos identificar, realmente, os problemas que merecem uma chamada de atenção dos médicos? Ou somos daqueles que falam da pessoa pra todo mundo e, menos para o interessado? Talvez, quem sabe, a melhora de algum profissional da medicina está dependendo de uma crítica mais verdadeira e direta da sua parte.  Crítica que não é direta e sincera é apenas fofoca. E, fofoca estraga a vida de qualquer vivente, inclusive de quem a alimenta.

Como é difícil agradar as pessoas. A dificuldade aumenta quando está associada à incompreensão. De fato, ninguém é perfeito. E, não dá para exigir 100% de eficiência de nenhum ser humano. Mas as pessoas são implacáveis, parece que têm um grande estoque de defeitos para jogá-los sobre aqueles que, segundo os julgamentos circunstanciais precisam de um rótulo.

A incompreensão e rotulação sobre os médicos acontecem sob diversos aspectos. Se atendem depressa são chamados de “dinheiristas”; se atendem devagar são “embrulhões”. Se erram num diagnóstico ou cirurgia são chamados de açougueiros; se acertam, nem um muito obrigado – “não fizeram mais do que a obrigação”, dizem. Se não receitam remédio, não são bons médicos; se receitam é porque estão ganhando comissão.

Rótulos e mais rótulos… Vá entender o povo!

ASSIM DIZ A PALAVRA: “Honre os médicos por seus serviços, pois também o médico foi criado pelo Senhor…” (Eclesiástico 30,1-4.6-14).

Você conhece os médicos de sua cidade? Já precisou do serviço deles? Contentou-se apenas em pagar-lhes ou foi-lhes, também, agradecidos? Já parou para pensar que, por mais limitado que seja um médico, precisamos de um para a nossa saúde? Você é também daqueles que detesta determinado médico só porque fulano disse isso, disse aquilo…?

Uma última pergunta: você teria pique para ser médico? Faria o que faz um médico?

O dia 18 de outubro já passou, mas, visite um médico para agradecê-lo e incentivá-lo no trabalho; ofereça alguma prece a Deus por ele; mande-lhe um cartão; faça uma chamada telefônica dando-lhe os parabéns; motive uma outra pessoa para fazer o mesmo. Lembre-se, muitos são os que criticam e procuram destruir com palavras mas, poucos são os que incentivam, valorizam e reconhecem o valor e o serviço dos outros. Se você quiser, pode ser um daqueles que incentivam e não sucumbem ao falatório sem freio.

Aos médicos dizemos: Perseverem na profissão, não como simples meio de capitação de recursos, mas como justo “ganha pão”; não como executor de técnicas, mas como quem está a serviço da vida; não como quem tem um número de inscrição junto ao Conselho de Medicina, mas como quem tem compromisso ético; não como quem não se aproxima para não se envolver, mas como quem se envolve para curar; não como quem atende em função do relógio, mas da necessidade do paciente; não como quem trata de um estranho, mas como alguém que cuida de um irmão.

ORAÇÃO: Senhor Deus, médico dos médicos, abençoai e santificai todos os médicos; dai-lhes sabedoria e discernimento para a boa realização do seu ofício; conduzi os seus passos para que possam ir ao encontro dos enfermos; sustentai as suas mãos para que promovam a cura dos males e doenças. Dai-lhes vida longa. Amém!

PE. EDIVALDO PEREIRA DOS SANTOS




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O maior educador do mundo não cursou nenhuma faculdade. Seu ministério durou apenas três anos, mas sua doutrina atravessa milênios e produziu o maior acervo humano de estudos e considerações sobre o que ensinou com divina maestria. É claro, nos referimos ao detentor de toda Sabedoria, o Mestre dos mestres, Jesus de Nazaré.  Todo educador tem uma característica especial no ofício de ensinar. Seja no aspecto da abordagem, no tom da voz, na postura física, nos meios que usa ou mesmo no olhar, cada mestre utiliza-se de seus carismas para cativar a atenção de seus ouvintes e lhes transmitir novas lições, conceitos, ideias. É o segredo da pedagogia autêntica: cativar primeiro, transmitir depois.

Teria Jesus algumas dessas artimanhas? Quando completou doze anos, procurou os professores da época, os doutores da Lei. Foi ensinar aos mestres. Dizem os Evangelhos que aquela criança especial ensinou mais do que buscou aprender. A idade não era impedimento para manifestar a Sabedoria de que era detentor. Tranquilamente, sem alarde, sem presunção, o menino se pôs entre os doutores, “ouvindo-os e interrogando-os”. Pôs se à escuta, para conhecer o terreno. Algumas perguntas, como quem nada quer, possibilitaram-lhe avaliar melhor aqueles que se arvoravam em conhecedores da doutrina, senhores da Lei de Moisés, guardiões da conduta e da moral do povo de Deus. Mas o menino se dava a conhecer aos poucos. Com uma observação aqui e um comentário ali, revelou-se paulatinamente, a ponto de todos se silenciarem para melhor atenção às suas palavras. “Todos os que o ouviam estavam maravilhados da sabedoria de suas respostas” (Lc 2,47). Fazia um preâmbulo para a mensagem que traria anos depois. Sua hora ainda não chegara! O menino Jesus “crescia em sabedoria e graça”, buscando os elementos básicos para aprimorar seus métodos de ensino, a mais perfeita das pedagogias da cultura humana.

Aos trinta anos, “cheio de força do Espírito, voltou para a Galileia”, para oficializar seu ministério. “Ensinava nas sinagogas e era aclamado por todos”. Sua oratória possuía um timbre especial – não o dos grandes oradores – permeado pela simplicidade, sabedoria e a verdade límpida e cristalina de uma revelação de amor. Em Nazaré, onde se criou, ousou ler um trecho de Isaias (16) e o atribuiu como referência à sua pessoa. (O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu e enviou-me para anunciar…) Tranquilamente enrolou o livro e afirmou com simplicidade: “Hoje se cumpriu este oráculo que vós acabais de ouvir” (Lc 4,21). Aqui começou a divisão. Aqui se plantou a discórdia dentre seus ouvintes. Poderia um simples filho de carpinteiro, conhecido de todos, arrogar para si tão sagrada missão?

A possibilidade de sucesso na arte de ensino exige, muitas vezes, o uso de máscaras, falsetes, jogo de cintura e até flexibilização de alguns conceitos, quando se quer conquistar um discípulo. Muitos dos nossos mestres se vendem dessa forma. Ensinam o que o aluno quer e não o que sua matéria pontifica. São cautelosos com suas doutrinas, para não ferir conceitos e costumes enraizados na cultura do ouvinte. Medem seus passos, no intuito de cativar um mínimo de simpatia. São condescendentes com práticas, ideias ou comportamentos às vezes contrários às próprias convicções. Falseiam a verdade que conhecem. Temem críticas à matéria ou comentários contra suas pessoas.

O Mestre dos mestres fez de sua doutrina um tesouro escondido, que se revela aos que o buscam com esforço pessoal. Não como aqueles que se inflam de sabedoria humana e facilmente se perdem dentro da prepotência do saber. O maior educador do mundo, apesar de detentor da sabedoria divina, aprendeu de sua paciência em observar a cultura humana. Soube, como ninguém, valorizar as lições de casa, atribuindo a si próprio toda sabedoria humana: “Eu sou o caminho, a verdade, a vida”…

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]




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UMA ANDORINHA NÃO FAZ VERÃO

Ainda é primavera, é verdade. Mas as primeiras incursões de andorinhas americanas em meu quintal já anunciam o verão. Logo serão milhares, em revoada lírica sobre nossos telhados, fugindo do inverno do hemisfério norte, mas deixando aqui seus alaridos e dizendo a todos que sol e calor lhes dão energia para voos tão longínquos. Fazem-me pensar na beleza da vida e no esforço de sempre a louvar, apesar da árdua viagem longe dos ninhos. Aqui encontram mais calor, mais alimentos, luz e beleza…

Aves migratórias seguindo o rastro do Sol! Pudéssemos também nós entender o sentido dessa viagem em nossas vidas! Pudéssemos trazer para nossa existência a lição que esse esforço inspira! Em especial neste mês missionário! Em especial quando somos convidados a refletir sobre o valor de nossa presença neste mundo, no qual temos por ideal cristão a tarefa de levar conosco a bagagem de nossa fé, a vida missionária. Não é uma tarefa que se cumpre por obrigação, mas razão de ser, essência da missão que um dia recebemos no ninho das nossas origens cristãs. Não preciso aqui repetir os refrãos que sibilam em nossos ouvidos desde a catequese, mas toma-los com mais critérios para alimentar nossa viagem neste mundo, nossos voos existenciais em busca do verdadeiro Sol, a luz que nos ilumina por completo, a razão de nossa fé. Eis pois: é Deus quem nos alimenta, nos aquece e nos revela a beleza da vida cristã.

Mas as andorinhas nos ensinam. Uma só não faz verão. Sozinha não faz borbulhar o espetáculo de um mistério da natureza, seus voos repletos de lições de sobrevivência, de encantamento, de louvor. Quem nunca se encantou com elas? Eis que o conjunto é que faz o espetáculo. Eis que na vida missionária da igreja que somos, uma única voz soa a um grito no deserto, não convence, não revela a importância da luz que nos atrai, não faz verão. Dai a importância de uma vida missionária coesa, em sintonia com as diretrizes da Igreja, em harmonia com os ensinamentos de Cristo, em concordância com os riscos que uma viagem tão longa e misteriosa – a vida – nos faz realizar com alegria e determinação. Não importa a distância. Não importa o quadrante, o hemisfério, o terreno árido ou fecundo, mas são estes o destino onde nossa missão se realiza, permanente ou momentaneamente, para saudarmos a vida e glorificarmos seu Criador, nossa Luz.

Unamos nossas forças nessa viagem. Deus nos guia e nos conduz em direção à vida. Sem bolsas, sem alforjes. Ensina-nos a viagens mais audaciosas em nossos planos existencialistas. Quer-nos em sintonia com Ele, confiando sempre em sua Providência. Dá-nos o alimento necessário, não só o pão de cada dia, mas igualmente o pão do céu, sua palavra em nossa boca. Assim se constrói um espírito missionário. Aberto para o mundo e para sua realidade. Confiante nos planos de Deus. Sejam estes bem realizáveis dentre os nossos, no mundinho de nossas origens ou em terras distantes, onde sua luz e sua inspiração nos guiou para também lá fazer brilhar os mistérios da nossa natureza divina. Isso tudo não é subserviência à sua vontade, mas transbordamento da verdade que domina uma criatura agradecida pelo dom da vida. Somos sujeitos da transformação que sonhamos para o mundo. Um mundo sem os cravos da violência, da corrupção, da fome e da injustiça que vemos campear em todos os hemisférios, de norte a sul, leste a oeste. Como andorinhas em revoada, a soma dos esforços individuais que nossa doutrina nos pede será a grande contribuição da presença missionária de nossa Igreja no mundo. Não menosprezemos essa força que temos, essa capacidade de transformar o mundo com nossa ação e presença, o voo missionário para anunciar novos tempos aos homens. Afinal, nossas ações concretas de fraternidade e misericórdia confirmam nossa missão: “Enviados para testemunhar o Evangelho da Paz”. Nada mais.

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]

 

 




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Para muitos leitores, nos dias atuais, o sinônimo para pentecostes é algo desconhecido; soa quase a um palavrão sem sentido algum. Uma palavra longe de sua origem festiva, seu verdadeiro significado. De fato, uma festa bem antiga, judaica por excelência, e que reunia em Jerusalém milhares e milhares de judeus do mundo todo. Uma festa eloquente, grandiosa, que chegava a durar sete semanas, quando o povo celebrava o resultado de suas colheitas e traziam ao Templo parte de seus dízimos de gratidão a Deus pelas dádivas da terra. E eis que já haviam decorridos cinquenta dias de outra grandiosa festa judaica, a páscoa, que  celebrava a passagem do anjo da morte, aquele que poupou somente as famílias onde suas casas tinham a marca do sangue do cordeiro imolado. Aquela páscoa se tornou a redenção do novo povo de Deus! Aquela páscoa é hoje razão de ser de nossa fé. Agora, decorridos cinquenta dias da ressurreição de Cristo, eis que sua promessa de nos enviar um defensor se realiza durante essa outra festa.

Essa mesma  promessa faz surgir um novo Pentecostes, uma nova festa da Colheita, agora com duração não de sete semanas apenas,(7×7=49+1) mas de sete dons… sete graças espirituais que nos foram derramadas dos céus quais bençãos divinas a fecundar nossas almas, nossas vidas sedentas de novas esperanças. Chegou nosso tempo de colheita, nossa festa de gratidão. Os dons derramados naquela humilde casa na periferia de Jerusalém possui o júbilo, a preciosidade de uma colheita abundante, que nossa insignificância e pequenez não merece, mas que a generosidade do Pai infunde em nós como sementes fecundas de uma seara privilegiada. Seus sete dons são os selos de predileção de Deus pelo seu povo, filhos amados e benditos que seu coração de Pai elegeu para si. Isso é o que somos! Isso é o que celebramos nesse Novo Pentecostes, a grande festa do destemor, da coragem, da audácia, da alegria e dos privilégios que os dons do Espírito Santo infundem naqueles que Ele escolheu para si. Por isso se diz que o sacramento do Crisma confirma em nós o sentimento de pertença a Deus, reveste-nos com a couraça da proteção divina, renova em nossos corações a maturidade da fé que recebemos em nosso Batismo, reforça nossas convicções da plenitude de vida advinda do Reino dos Céus, nos faz apreciar o que é justo e reto  e gozar das alegrias da consolação verdadeira… Isso e muito mais. Não apenas sete, mas setenta vezes sete… Infinitesimamente mais.

Como vemos, as significações numéricas dessa festa têm suas motivações históricas e tradicionais, mas perdem-se na avaliação quantitativa das graças que o amor de Deus proporciona àqueles que se deixam guiar pelo seu Espírito santificador. Não podemos medir ou quantificar o Amor, em especial Aquele que se diz o próprio. Esse não tem limites, origem, princípio e fim. Esse está em tudo, toma conta, invade, preenche. É a fonte, o manancial de tudo que dá sentido à vida, a tudo o que somos, temos ou iremos ser e ter um dia. Entregar-se a essa graça e unção é abandonar-se em Deus como instrumentos de sua ação no mundo, na história, na festa da colheita farta que Ele deseja realizar em nós, por nós. Esse é nosso tempo de semeadura, nossa razão de ser e de existir, de aqui estar de passagem, mas deixar em nosso tempo o registro de uma multiplicação infinitesimal dos dons que o Senhor depositou em nós. Seja nossa colheita cevada ou trigo, quanto devolveremos a Ele, o dono da vinha, o Senhor da Festa? Você recebeu tantas moedas! Quanto de Dízimo devolverá ao Dono da casa… dessa casa que é a vida, o mundo? Lembre-se: não vale devolver os mesmos sete dons. Não esconda suas moedas; multiplique-as!

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]

 

 




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A páscoa chegou e, com ela uma série de interrogações! Qual a sua origem? Quem mentalidade a formou? Que elementos importantes se pode destacar dela? Como entendê-la na fé cristã?

A Páscoa é uma festa de origem pastoril. Sempre foi celebrada pelos pastores nômades na primeira lua cheia da primavera.  Na noite anterior eles passavam o “gado” dos pastos do inverno para os pastos da primavera. E tal passagem era considerada por eles como muito perigosa, porque acreditavam eles – um “espírito exterminador” ameaçava matar o rebanho naquela noite. Para esconjurar tal perigo e tal ameaça, os pastores reuniam-se na noite anterior à da passagem da estação e ofereciam à  “divindade dos campos” um cordeiro em sacrifício; e com o sangue do cordeiro, recolhido numa bacia, ungiam a soleira das tendas, os batentes e a tenda.  Era um rito apotropálco (isto é, de esconjuro), para afastar o espírito exterminador.

Os israelitas conheciam essa festa antes mesmo de descerem para o Egito, onde viveriam e seriam depois escravizados (Gn 50,14; Ex 1). Quando reconheceram a ação libertadora de Javé que os tirará do Egito, eles usaram essa festa para celebrar tal acontecimento, fazendo-lhe porém, algumas adaptações: comer a ceia comemorativa de pé, cingidos, apressadamente, etc. (Ex 12,1-28). Assumem, por outro lado, os aspectos apotropálcos da celebração pastoril, dando-lhe também nova interpretação: é Javé quem livra os hebreus, ameaça e pune os egípcios. O livro do Deuteronômio (16,1-5) modifica a prática ritual passando a celebração da festa para dentro do Santuário: o livro dos Números (9,2-14) estipula os requisitos da pureza ritual para tal celebração.

A Páscoa vem ligada à Festa dos Ázimos, que era também uma festa agrícola, mas do povo cananeu que era um povo sedentário e não nômade. Era a festa da oferta das primícias das colheitas feitas à divindade como rito de ação de graças. No dia dessa festa jogava-se fora todo o fermento velho que se tinha em casa para fazer pão e fazia-se novo fermento. O sentido do rito era: “deixar a vida velha e começar vida nova”. O pão usado nessa Festa era o pão ázimo, isto é, pão sem fermento.

No Judaísmo e no Cristianismo todos esses elementos são retomados e reelaborados dentro da ótica pascal de cada religião. No Cristianismo a Páscoa/passagem lembra a paixão-morte e ressurreição de Jesus, que faz a nova e definitiva passagem: da escravidão do pecado para a liberdade da graça de Deus; o cordeiro pascal é figura de Jesus, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (Jo 1,29); o sangue do cordeiro é figura do sangue redentor de Jesus; o fermento novo é figura da vida nova pascal, trazida por Jesus. De acordo com os sinóticos (os três primeiros evangelhos), a Ceia que Jesus celebrou na noite anterior à sua morte, foi a Ceia pascal (Mt 26,2 17-19; Mc 14,12-17; Lc 22,7-14); daqui procede o significado teológico da Ceia como Eucaristia, ação de graças, memorial.

A data da celebração da Páscoa varia de ano pra ano porque, depois de muita confusão quanto à sua celebração o Concílio de Nicéia (ano 325) adotou o critério de celebrá-la conforme a tradição dos antigos pastores: na lua cheia da Primavera. E estabeleceu que a Páscoa deveria ser sempre celebrada no primeiro domingo depois da primeira lua cheia da primavera européia e que ocorria entre os dias 12 de março e 26 de abril.

Há um transbordamento da história das origens pastoris e israelitas da páscoa para a fé cristã onde tudo tem seu conteúdo e expressão máxima em Cristo, o Ressuscitado.

Desejo-lhe uma Páscoa Santa e Cristã. O que vale é o Cristo!

Feliz Páscoa!

PE. EDIVALDO PEREIRA DOS SANTOS 




DIOCESE DE ASSIS

 

Primeiramente, necessito explicar o que seja um jejum, já que palavras com atributos religiosos, nos dias de hoje, soam estranhamente aos ouvidos de grande maioria. Sim, exercícios espirituais perderam sentido numa sociedade extremamente alheia a muitas das questões de fé. Jejuar ou abster-se são verbos desprovidos de significado num mundo onde consumir e enfastiar-se é a prioridade social. Como então compreender uma atitude de renúncia diante do muito que o mundo nos oferece?

Essa é a primeira questão. Fora da disciplina religiosa, jejum nada significa. A não ser nas falidas e horrorosas práticas de dieta alimentar, diante da explosão de banhas e gorduras que seu excesso proporcionou. Mesmo assim, essa questão estética já quase não possui adeptos, pois outras fórmulas milagrosas e até radicais fazem mais sucesso que o santo e inofensivo jejum. Fechar a boca é imoral; então que se reduza o estômago! Perco um pouco de uma digestão sadia, mas nada perco do prazer de degustar, consumir, consumir, consumir. Assim mantenho a boca livre, a língua solta…

Há aqui uma associação não só de aspecto físico e nutricional, mas igualmente de aspecto moral, religioso. O fausto alimentar, muitas vezes, denuncia subnutrição espiritual. Um complementa o outro. Quem possui alto índice de saúde espiritual raramente prioriza seus hábitos alimentares como essenciais à saúde física. Epa, calma! Não estou aqui a dizer que nossos gordinhos não possuam vida espiritual sadia ou vice versa. O que digo é que o equilíbrio entre uma energia e outra, entre o ser espiritual que habita em nós e a vida biológica que ocupamos necessitam de hábitos saudáveis. Dentre estes, o jejum. Mas “nem só de pão vive o homem – ensinou o mestre cristão – mas de toda a palavra que sai de seu coração”. Eis aqui o grande princípio do jejum pleno, perfeito! Jejuar também na contingência de nosso palavreado solto, irresponsável, sem freios, sem limites. Jesus, em sua sabedoria divina, nos mostra o quanto destruímos com nossos hábitos que saciam muito mais as discórdias de nossos corações, do que o vazio de nossos estômagos.

O jejum verdadeiro não é uma simples abstinência, uma renúncia momentânea, mas uma prática saudável de aprimoramento tanto espiritual quanto físico. Às vezes é mais fácil renunciar a um hábito de consumo do que a um vício que afete a espiritualidade. Deixar de lado um vício torna-se uma prática benéfica à vida, física e espiritualmente falando. Dai que jejum não é um ato de penitência quaresmal que diz respeito apenas ao seguidor deste ou daquele preceito religioso, pois que a renúncia, por si, é um gesto constante no exercício de fé. Jejuar também é uma disciplina de aprimoramento humano, pois que nos impõe limites e condiciona nossos hábitos.

Entretanto, a fé cristã nos pede mais, sobretudo, discrição em sua prática. Ou seja: “quando jejuardes –assim como quando orardes- não fiques triste”, mas disfarça ao máximo essa sua prática para que só você se beneficie dela. Em especial, a penitência que fazemos com a prática do jejum nos aproxima mais de Deus, que se agrada diante de um coração penitente. Sobretudo, façamos um exercício de “jejum de palavras”, estas que ponderam e justificam todas nossas ações e condenam ou sentenciam qualquer ação daqueles que pensam diferentemente de nós. Desse jejum estamos carentes!

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]