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Lá vai Maria

Lata d’água na cabeça

Lá vai Maria

Lá vai Maria

Maria Mercedes encantou e inspirou o autor dessa música se equilibrando com nobreza e alegria sob o peso da miséria e do preconceito. Inspirou a canção que fala do brio de uma gente que, mesmo sofrendo, vive de esperança.

O tempo passou e ainda há marias e josés tendo que buscar longe o que devia estar perto, por direito: água, sustento, abrigo.

Maria fez de sua lata um adereço! Foi para o palco, para a avenida. Tripudiou, brincou e dançou com o peso que a vida insistia em lhe impor: dificuldades e dores.

Sua lata viajou, conquistou o mundo, e sua beleza conquistou inclusive um suíço com quem se casou. Maria contava com alegria sua experiência no exterior, e dentre elas, uma situação inusitada quando foi surpreendida com uma lambida em seu braço e a admiração da criança europeia que exclamou: “você é feita de chocolate!” (riso largo).

Após 30 anos, voltou ao Brasil e, ao encontrar, através da fé, seu grande amor (Jesus), “encenou” seu último ato. Trazendo sua inseparável lata, agora carregada com a “água viva”, transbordando alegria, paz, amor e esperança.

Nem a idade, nem a doença a fizeram perder a elegância e o riso fácil com que encarava a vida. Dona Maria se equilibrou mais uma vez com altivez, sem deixar a água cair. Eternizada também na letra da canção com seu nome, a gente canta em sua homenagem:

Lá vai Maria

Sobe o morro e não se cansa

Que grande mulher!

Osvaldo Luiz Silva é jornalista, trabalha há 33 anos na Canção Nova, e escreveu o livro “A Vida é Caminhar”, que relata fatos da década de 1970 na vida do padre Jonas Abib.




Educação e cidadania: pilares para futuro sustentável

 

 

Investir nas pessoas no tempo presente é um princípio básico e pode ser uma das maneiras mais efetivas de garantir um futuro mais sustentável. Cuidar, renovar, conservar a natureza é crucial. Igualmente essencial é promover, valorizar, estimular e educar, garantindo o presente e construindo um futuro melhor para a juventude atual e os adultos de amanhã. Em uma sociedade em constante transformação, fica cada vez mais evidente a necessidade de olhar para o ser humano com a premissa da promoção da educação de qualidade. Não à toa, o tema figura como o quarto Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS), um apelo global norteado pela Organização das Nações Unidas (ONU), visando ao alcance da Agenda 2030 e à construção de uma sociedade com mais prosperidade.

No Paraná, diversas empresas, instituições e entidades têm aplicado a expertise em suas áreas de atuação na promoção dos objetivos propostos pela ONU por meio de boas práticas de conservação ambiental e desenvolvimento econômico e social, além da promoção da educação. No último quesito, o Centro de Integração Empresa-Escola do Paraná – CIEE/PR tem realizado, há mais de meio século, inúmeras ações com enorme sucesso.

A entidade, reconhecida por contribuir na capacitação e integração de talentos às empresas, desenvolve outros programas, talvez menos conhecidos, mas igualmente importantes para esse futuro almejado. O “Família em Ação” envolve pais e responsáveis dos estudantes, em especial aqueles em situação de vulnerabilidade, para refletir sobre a convivência com os jovens e a promoção de vínculos familiares. Essa iniciativa é oferecida gratuitamente à comunidade e envolve debates e dinâmicas específicas, organizadas por uma equipe multidisciplinar do CIEE/PR. 

O mérito do programa foi recentemente reconhecido com o Selo SESI ODS por conectar-se a três objetivos propostos pela ONU:  Erradicação da Pobreza (ODS1), Educação de Qualidade (ODS4) e Trabalho Decente e Crescimento Econômico (ODS8). Esse trabalho tem assegurado a relevância do papel da família na formação cidadã e no protagonismo dos filhos na vida pessoal e profissional.

Somado a isso, a aprendizagem e o estágio preparam e integram os jovens ao mundo do trabalho. Geram a oportunidade de aprenderem e respeitarem a diversidade de percepções, entendimentos e compreensões do sentido da vida em sociedade. 

Os resultados alcançados estão vinculados à essência do CIEE/PR, que entende os desafios de gestão e da sociedade. Por meio desse conhecimento intrínseco, a entidade gera impacto positivo com ações de cidadania, capacitação profissional e geração de renda, capaz de incentivar o protagonismo jovem, envolver e reforçar vínculos familiares em todo o estado do Paraná. Segundo o professor e filósofo americano, John Dewey, “A educação não é preparação para a vida; A educação é a própria vida”. Dessa maneira, o futuro mais próspero e sustentável torna-se possível: investindo em pessoas e transformando vidas por meio da educação. 

 

Antoninho Caron é presidente do Centro de Integração Empresa-Escola do Paraná (CIEE/PR).




Como práticas ESG podem contribuir para uma gestão sustentável?

 

Práticas que priorizam a sustentabilidade, a responsabilidade socioambiental e a transparência estão sendo amplamente adotadas por empresas que buscam desenvolvimento sustentável e geração de valor, não apenas pela ótica do retorno financeiro, mas também a partir do entendimento sobre seus impactos ambientais, sociais e de governança.

Sustentabilidade e ESG (Environmental, Social and Governance) são termos que, embora apontem na mesma direção, têm nuances distintas, já que a sustentabilidade é o objetivo final do desenvolvimento Humano. Ela representa um equilíbrio entre melhorar a qualidade de vida da sociedade, respeitar os limites ambientais do planeta e promover a prosperidade econômica.

ESG, por sua vez, refere-se a um conjunto de critérios ambientais, sociais e de governança. Esses critérios são usados para avaliar riscos, oportunidades e impactos, com o objetivo de orientar atividades, negócios e investimentos sustentáveis.

Entendida essa diferença, detalho a seguir como essas práticas podem contribuir para uma gestão sustentável na área da saúde, mais especificamente nas Organizações Sociais de Saúde (OSS).

Assegurar a conformidade com leis e normas éticas é fundamental para a sustentabilidade das organizações. À medida que o cenário regulatório evolui, as instituições buscam incessantemente aprimorar seus modelos de governança, visando identificar e coibir comportamentos incongruentes com seus valores, alinhando-se aos códigos de conduta. Esse compromisso não apenas atende a exigências legais, mas também impulsiona uma cultura organizacional ética, refletindo o comprometimento contínuo com a integridade e a responsabilidade.

No CEJAM, criamos um canal de denúncias aberto, confidencial e sigiloso, que garante o anonimato e assegura a não retaliação ao denunciante de boa-fé. É uma via de comunicação a serviço dos colaboradores, prestadores de serviços e comunidade em geral. Estimulamos sua utilização, pois acreditamos que essa ferramenta é importante na prevenção e detecção de desvios de conduta, aprimoramento da gestão e fortalecimento da cultura ética institucional.

O Instituto CEJAM, responsável por coordenar ações de responsabilidade socioambiental do CEJAM – Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim”, é um exemplo inspirador e vem reforçando o seu compromisso através de diversas ações.

Entre as principais iniciativas, destacam-se a gestão de resíduos sólidos, eficiência hídrica e energética e criação de ambientes acolhedores e projetos socioambientais voltados para as comunidades próximas, abordando temas como agricultura urbana, arborização e promoção da reciclagem de resíduos.

A melhoria das etapas de gerenciamento de resíduos nas unidades de saúde sob a administração do CEJAM surgiu durante a pandemia, quando ficou evidente a necessidade de adotar práticas mais modernas na área. E, por se tratar de resíduos, todos os setores, colaboradores, terceiros e frequentadores dos serviços de saúde passaram a se engajar nesse processo.

De lá para cá, observamos mudanças de hábitos e cultura em muitos de nossos colaboradores. Percebemos uma relação mais consciente com o setor de compras, optando por adquirir produtos que geram menos resíduos. Além disso, houve uma redução na quantidade de resíduos gerados, incluindo os infectantes, um aumento na separação dos resíduos recicláveis e uma redução da quantidade de resíduos enviados para aterros sanitários.

O Instituto também vem trabalhando ativamente em seu pilar de eficiência energética. A Santa Casa de São Roque, gerenciada em parceria com a prefeitura local, já conta com um sistema de fornecimento de energia elétrica alimentado por fonte solar. Agora, em 2024, a iniciativa será estendida a outras unidades de saúde públicas, em colaboração com a ENEL.

Com a implementação desse projeto, planejamos gerar energia suficiente para manter as unidades de saúde funcionando e fornecer energia limpa para a rede pública, contribuindo, assim, para a redução do consumo de energia proveniente de fontes mais poluentes.

Entre 2022 e 2023, um plano de gestão sustentável de recursos hídricos em hospitais públicos, como o Hospital Geral de Itapevi e a Santa Casa de São Roque, atingiu a marca de 35% de economia mensal, período em que foram poupados mais de 12 mil metros cúbicos de água.

E mais! Mesmo com a redução do consumo, não houve qualquer impacto negativo na prestação de serviço. Ou seja, a garantia da qualidade do serviço se mantém em consonância com os padrões de biossegurança e controle de infecções, conciliada com a economia dos recursos hídricos. As modificações estruturais, como instalação de economizadores e reuso da água, demonstraram que a sustentabilidade também pode ser economicamente eficiente

Acreditamos que a sustentabilidade é a base para uma saúde robusta e resiliente. No CEJAM, não se trata apenas de práticas ambientalmente conscientes, mas de moldar um futuro em que a saúde, a eficiência financeira e a consciência ambiental coexistam harmoniosamente. Estamos comprometidos em liderar não apenas pelo exemplo, mas pelo impacto positivo que nossas ações têm na saúde das pessoas e do planeta. Juntos, seguimos transformando vidas e construindo um futuro sustentável de cuidado, amor e esperança.

 João Romano é gerente executivo do CEJAM (Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim”)

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Os efeitos danosos da venda sem receita de medicamentos tarjados em drogarias

 

Nos últimos meses, alguns medicamentos ficaram “famosos” ao se tornarem extremamente populares no país. Como exemplos, temos o Ozempic (semaglutida), concebido para tratamento de diabetes, mas que tem sido usado para acelerar a perda de peso; e o Venvanse (dimesilato de dexanfetamina), que é indicado para pessoas com TDAH, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, mas que tem sido utilizado por indivíduos saudáveis, como estudantes e executivos, para melhoria da concentração e foco em tarefas cotidianas.

Trata-se do uso off label de medicamentos, que não é proibido no Brasil. Médicos costumam prescrever certas drogas pelos efeitos secundários que promovem, que são diferentes dos que constam em bula. O problema ocorre quando a venda é feita sem o suporte da prescrição de um profissional habilitado.

Medicamentos com tarja vermelha somente podem ser vendidos sob prescrição médica. No entanto, não é obrigatório às farmácias fazer a retenção de segunda via para escrituração das receitas, o que somente ocorre com antibióticos, entorpecentes e psicotrópicos listados pela Agência Nacional da Vigilância Sanitária (Anvisa).

A não exigência de retenção de receita ocasiona uma das maiores distorções da lógica regulatória do varejo de medicamentos:  qualquer pessoa que solicite remédios de tarja vermelha no balcão da farmácia conseguirá comprá-lo sem apresentar a prescrição médica.

Este é o caso do Ozempic. Para as drogas que precisam de retenção, o mercado ilegal e paralelo de receitas responde pelo desvio, para fornecimento a pessoas que não tem indicação médica.

Nos balcões das drogarias, atendentes afirmam com convicção que medicamentos sem retenção de receitas são de venda livre, o que absolutamente não procede. Mesmo assim, há anos essas vendas ocorrem sem qualquer restrição e sem que a fiscalização tenha mecanismos para identificar as vendas irregulares.

Como consequência, temos a falta de medicamentos no mercado, prejudicando pacientes que realmente precisam. Além disso, pessoas que não possuem indicação e acompanhamento médico podem sofrer complicações e efeitos adversos graves ocasionados pelo seu uso.

Por que não vemos uma fiscalização mais efetiva por parte da vigilância sanitária para coibir esses abusos?

Nas farmácias de manipulação, toda receita precisa ser registrada em sistema (Livro de Receituário), com nome e registro profissional do prescritor, mesmo que não seja obrigatória sua retenção. A fiscalização para esses estabelecimentos é rígida, mas o mesmo não ocorre com as drogarias.

Outro exemplo do tratamento regulatório desigual: as farmácias de manipulação são proibidas até mesmo de anunciar através da internet medicamentos isentos de prescrição, além de cosméticos e suplementos que podem perfeitamente ser fornecidos a qualquer pessoa interessada. Já as drogarias colocam esses produtos à disposição de consumidores, no balcão das lojas ou em meios virtuais, mesmo quando há a exigência de prescrição médica para aquisição.

A legislação sanitária traz critérios bastante objetivos para saber se um medicamento ou um produto para saúde é classificado como isento de prescrição médica.

Dentro deste cenário fica uma questão: a quem interessa que o medicamento industrializado tarjado possa ser vendido livremente sem qualquer controle?

A indústria farmacêutica não se opõe a esta prática, mesmo quando os remédios ficam em falta no varejo. Obviamente, os recordes de vendas são vantajosos para o segmento. Quando os lotes são falsificados, a indústria notifica a Anvisa, que age para divulgar os lotes falsos.

Portanto, é necessário que se retome o debate sobre mudanças importantes na regulação e fiscalização para evitar essa distorção do mercado e também a venda desenfreada de medicamentos que podem colocar em risco a saúde da população.

 

Claudia de Lucca Mano é advogada, consultora empresarial, especialista na área de vigilância sanitária e assuntos regulatórios, fundadora da banca DLM e responsável pelo jurídico da associação Farmacann.




Indignação e solidariedade com a morte de policiais irmãos

 

A Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol do Brasil), entidade de classe de âmbito nacional representativa da categoria de Delegados de Polícia no Brasil, manifesta sua indignação aos crimes hediondos perpetrados na forma de homicídios com torpeza e emboscada aos irmãos policiais militares soldado Samuel Wesley Cosmo, 35 anos, lotado na ROTA da Polícia Militar de São Paulo, vitimado na última sexta-feira (02) em Santos, no litoral paulista.

Sua revoltante morte se soma ao homicídio igualmente hediondo perante seu irmão policial militar Kennedy Cosmo, praticado por bandidos mediante emboscada em Santo André, no ano de 2018.

Essa tragédia vergonhosamente se torna a banalização do mal em nosso país, cuja sociedade, demais órgãos do Sistema de Justiça Criminal e determinadas instâncias políticas se acostumaram a conviver com estatísticas macabras de homicídios de policiais militares, civis, rodoviários federais, penais, federais, guardas municipais neste país.

Para agravar, vê-se um conjunto deliberado de estereótipos, incompreensões, deturpações unformeticas e estudos enviesados de certas organizações não-governamentais quanto ao fenômeno “letalidade policial”, em geral pré-condenando policiais com fulcro no senso comum, vieses informacionais e ignorância banalizada, formando um deplorável caldo de cultura que polariza o sentimento da opinião pública em relação aos policiais no Brasil. Notadamente quanto ao uso da força e sacralização de criminosos tratados como “bandidos sociais” ou “excluídos reativos à pobreza”, “a vitimização policial é consequência da letalidade policial deliberada”, como se teorias e estudos criminológicos inúmeros que avalizam fatores culturais criminógenos e o livre-arbítrio para a delinquência não tivessem pertinência causal na criminalidade e fossem os policiais e agentes da segurança pública os determinantes causais da violência no Brasil – um devaneio próprio de uma Nação subdesenvolvida em valores, políticas e prioridades.

A Adepol do Brasil clama para que as entidades de classe de âmbito nacional legitimadas na defesa das categorias policiais, segmentos da sociedade civil realmente comprometido, classe política, academia e o Governo Federal e governos estaduais se articulem em ações institucionais e de mudanças legislativas, tais como:

– estruturação de unidades especializadas em apuração e repressão qualificada a homicídios contra profissionais da segurança pública de qualquer carreira– aplicação de regime obrigatoriamente fechado em regime disciplinar diferenciado em unidades penitenciárias de segurança máxima para homicídio qualificado ou lesão corporal com resultado morte perpetrados contra tais profissionais;

– apoio irrestrito a procedimentos de investigação qualificada de cooperação e ligação de certas organizações não governamentais potencialmente vinculadas a facções criminosas;

– criação de memorial nacional de servidores da segurança pública vitimados em serviço ou em razão da função;

– instituição de programa nacional de apoio, em variadas medidas, às famílias de policiais e guardas municipais mortos em serviço ou em razão da função; tratamento processual prioritário em processos;

– crime instaurados para persecução penal de homicídios e lesão corporal com resultado morte de servidores da segurança pública.

Outras medidas efetivas de enfrentamento à vítimização policial podem ser complementadas em apoio a esta grave mazela nacional, que reflete um cenário de normalização da desgraça e da iniquidade, no qual o Brasil é o país do Hemisfério Ocidental com maior número anual absoluto de mortes de profissionais da segurança pública de todas as carreiras.

 

Rodolfo Queiroz Laterza é presidente da Associação de Delegados de Polícia do Brasil – ADEPOL DO BRASIL. Mestre em Segurança Pública e pós-graduado em Politicas e Gestão em Segurança Pública, em Direito Penal e Processo Penal, Medicina Legal e Ciências Forenses, Criminologia , Ciência Política e em Direito Público, historiador e pesquisador de conflitos armados. 




A “República do Paraná” em risco: a possível cassação e inelegibilidade de Sergio Moro 

 

 

Pouco antes do início do recesso judiciário de 2023, os processos que podem levar à cassação do ex-juíz e hoje senador da República Sergio Moro (União Brasil-PR) e de seus suplentes tiveram andamento importante. A Procuradoria Regional Eleitoral do Estado do Paraná exarou parecer, manifestando-se pelo julgamento de procedência parcial dos pedidos em tela, a fim de reconhecer a prática de abuso do poder econômico e, como consequência, anular a chapa eleita em outubro de 2022 para o cargo. Também se prevê a decretação da inelegibilidade de Moro, bem como de seu suplente direto, Luís Felipe Cunha, pelo significativo prazo de oito anos.

Antes de apontar especificamente qual teria sido a irregularidade praticada por Moro, é preciso esclarecer que, por mais que o processo de escolha de representantes por meio de eleições seja a pedra de toque das democracias, o acesso ao poder depende do rigoroso cumprimento de princípios e de regras estabelecidas por lei, incluindo as partidárias (internas), além das eleitorais.

Logo, se faz necessário que, aliado ao desempenho satisfatório nas urnas, o candidato cumpra fielmente os princípios e as determinações do processo eleitoral democrático.

Quanto ao regramento que deve ser levado em consideração, cito, por exemplo, a necessária igualdade de condições entre os contentores da corrida às urnas, o que busca evitar que alguns postulantes tenham vantagens excessivas sobre os outros.

O objetivo de uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) – espécie de demanda proposta contra Moro – é impedir e investigar a prática de atos que possam, de alguma maneira, afetar a isonomia dos candidatos numa eleição. E, segundo dispõe a lei complementar 64/1990, em seu artigo 22, uma das espécies de abuso do poder eleitoral é justamente o desvio ou o abuso do poder econômico.

Se atribuiu à chapa de Sergio Moro justamente a prática de poder econômico, em função da existência de gastos vultosos, especialmente na pré-campanha.

Apenas para relembrar: antes de se candidatar a senador da República pelo Paraná e ainda capitalizando a popularidade atribuída pela operação “Lava Jato”, o ex-juíz tentou emplacar uma pré-candidatura à Presidência, pelo Podemos – isso, entre 2021 e início de 2022. Seria uma espécie de “terceira via”, longe dos extremos do PT e do bolsonarismo.

Posteriormente, Moro se desvinculou desse partido e se filiou ao União Brasil, visando, naquele momento, concorrer a deputado federal por São Paulo, conforme divulgado, na época, pela Imprensa. Somente após o indeferimento da transferência de seu domicílio eleitoral, uma vez que o lavajatista não morava em solo bandeirante, é que ele se debruçou à ideia de ser testado nas urnas do estado do Paraná.

Segundo cálculos da Procuradoria Geral da República (PGR), o montante gasto pela chapa de Moro, apenas na pré-campanha, representou 110,77% da média de investimentos realizados pelos dez candidatos ao Senado naquele estado, totalizando mais de R$ 5 milhões – o que supera, inclusive, o limite estabelecido para postulantes ao cargo de senador em 2022.

Fato é que, os vultosos recursos financeiros aplicados no período geraram grande visibilidade a Moro, além de promoção pessoal, em detrimento de seus adversários – o que caracteriza abuso de poder econômico.

Embora o parecer da Procuradoria não seja vinculativo, as chances de que seja acolhido pelas instâncias competentes são consideráveis, o que pode levar à cassação imediata da chapa e do mandato de Moro, à sua inelegibilidade e à determinação de que uma nova eleição para o cargo de senador seja realizada, tão logo, no Paraná.

A dúvida que fica é: faltou ao senador Sergio Moro conhecimento técnico eleitoral e um adequado assessoramento, na qualidade de pré-candidato e de candidato, ou o risco foi sabido e deliberadamente assumido? Para um ex-juíz, o cumprimento a regras deveria ser óbvio.

Não há no ambiente eleitoral nada a ser subestimado. A maior fiscalização, afinal, está no próprio meio político, onde qualquer escorregada é vista com lentes de aumento por desafetos e adversários, e pode custar caro, com direito a prejuízos legais, partidários e eleitorais incalculáveis.

 

Wagner Wilson Deiró Gundim é advogado; doutor em Direito Constitucional e em Filosofia do Direito




O poder de polícia e o respeito às Guardas Civis Municipais (GCMs) 

Uma rápida busca no Google com os termos “GCM prende” é o suficiente para verificar que a atuação das Guardas Civis Municipais de diferentes cidades paulistas já acontece para além do que determina, teoricamente, o estatuto nacional destas corporações. As GCMs têm papel reconhecido no combate à criminalidade, com prisões de traficantes, pedófilos, assaltantes, assassinos e feminicidas.  

A partir desta constatação, e com base no entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), levei à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) uma proposta, por meio do projeto de lei 1.702/2023, para garantir o poder de polícia às guardas paulistas. 

O debate em torno do que se chama de poder de polícia para as GCMs é de longa data. Recentemente, em 2023, o STF chancelou a atuação policial das corporações. Também a 3ª turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu que a Guarda Municipal já integra o sistema de Segurança Pública, embora sem deter as funções ostensivas típicas da Polícia Militar (PM), nem as atividades investigativas próprias da Polícia Civil. 

É pela fundamental necessidade de instituir esse direito à GCM das cidades bandeirantes que baseio essa proposta apresentada na Alesp – para que estas corporações tenham garantido o poder de polícia e que, consequentemente, passem a ter a nomenclatura de Polícia Municipal, que é o que já são, na prática. 

Nossa argumentação ganha corpo até mesmo com o ponto de vista contrário do STJ, uma vez que o relator do caso, ministro Rogério Schietti Cruz, lembrou que vários municípios já estão equipando as GCMs com armas de alto poder de letalidade.  

Vejamos: se as Prefeituras são autorizadas a equipar suas Guardas Municipais com armamento desse porte, é preciso considerar que tais corporações podem, sim, exercer, com eficácia, o apoio às Polícias Civil e Militar.  

Aliás, as Guardas Municipais já colaboram, em muitos casos, com as forças policiais estaduais. Estão não apenas melhor armadas e dotadas de núcleos de inteligência, mas, também, estão mais treinadas; e a maioria de seus comandantes vem de carreiras na área de Segurança Pública, com vasta experiência – é o caso, por exemplo, da Força Azul do município de Itaquaquecetuba-SP. A instituição faz uso, entre outros armamentos, de carabinas táticas (CTT.40) – uma das armas mais modernas e práticas para os policiais urbanos. À frente desta GCM está o coronel da Polícia Militar (PM) Anderson Caldeira, secretário de Segurança da cidade.  

Contudo, ainda há um hiato entre teoria e prática na segurança jurídica quanto ao papel policial das Guardas Municipais. É claro que cenário passa a mudar a partir do reconhecimento por parte do STF, já destacado nas linhas acima e que justifica minha proposta na Alesp, no sentido de regulamentar seu papel de Polícia, permitindo que as cidades paulistas tenham suas próprias Polícias Municipais e que estas possam atuar de forma mais ostensiva e preventiva nas ruas. 

Nossos municípios precisam ter suas Polícias Municipais reconhecidas por lei e serem vistas e respeitadas por toda a sociedade como forças de segurança efetivas, trabalhando integralmente com as corporações estaduais e a União no combate ao crime e na defesa dos cidadãos e das cidadãs de bem. É legítimo, é justo. 

 

Rafa Zimbaldi (Cidadania-SP) é deputado estadual reeleito para o segundo mandato; é presidente da Frente Parlamentar de Combate e Enfrentamento às Drogas, e membro efetivo da CPI da Epidemia do Crack e da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp); foi vereador por quatro mandatos em Campinas-SP e presidente da Câmara Municipal por duas oportunidades; é graduado em Relações Internacionais. 




Viagem de avião: direitos do consumidor para desistência, atraso e overbooking

 

O consumidor, quando compra uma passagem aérea, tem o direito de cancelar o bilhete e receber o dinheiro total de volta, respeitando algumas condições. Ele também tem garantias quando a empresa cancela ou atrasa o voo. Eu vou revelar o que está na legislação e o que fazer quando tiver overbooking na sua aeronave.

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) divulgou recentemente que, entre janeiro e novembro de 2023, foram transportados 102,6 milhões de passageiros no país, sendo 83,5 milhões em voos domésticos e 19,1 milhões em internacionais.

Mas, nem todo passageiro que compra a passagem consegue viajar. Neste caso, de acordo com o artigo 11, da Resolução 400/2016 da Anac, o consumidor, que compra o bilhete em loja física ou pela internet, pode recuperar toda a quantia paga, sem cobrança de taxa. Para isso, é preciso que a desistência ocorra dentro de 24 horas, após a compra da passagem, para bilhete adquirido com antecedência igual ou superior a sete dias em relação à data de embarque.

Outra possibilidade de ressarcimento integral é garantido pelo artigo 49, do Código de Defesa do Consumidor (CDC). A regra diz que o cliente pode desistir da passagem adquirida pela internet ou por telefone, no prazo de sete dias a contar da data da compra.

Quando há problemas de saúde ou de falecimento na família, devidamente comprovado e avisado previamente para a companhia aérea, o passageiro não pagará pelo cancelamento da viagem. Mas, a transportadora terá direito de reter até 5% da importância a ser restituída, a título de multa compensatória, conforme indica o artigo 738, do Código Civil.

Agora vamos conhecer os direitos do consumidor quando a empresa aérea muda o horário do voo. O artigo 20, da Resolução 400/2016 da Anac, diz que o transportador deve informar imediatamente ao passageiro que o voo irá atrasar. A companhia deve indicar a nova previsão de partida e manter o passageiro informado, a cada 30 minutos.

Se o atraso do voo for de mais de 4 horas em relação ao horário originalmente contratado, ou se houver cancelamento de voo ou interrupção do serviço, ou perda de voo subsequente pelo passageiro, nos voos com conexão, inclusive nos casos de troca de aeroportos, quando a causa da perda for do transportador, o consumidor pode escolher ser reacomodado em outro voo, reembolsado de maneira integral ou aceitar que o serviço seja cumprido por outra modalidade de transporte.

Por fim, o overbooking acontece quando a companhia aérea vende mais passagens do que o avião pode comportar, fazendo com que haja mais passageiros do que assentos disponíveis. O artigo 23, da Resolução 400/2016 da Anac, informa que quando isso acontece, a companhia aérea deve procurar por voluntários para serem reacomodados em outro voo mediante compensação negociada com o passageiro. Tem consumidor que aceita upgrade de categoria, por exemplo.

Se o cliente não quiser aceitar e se sentir prejudicado, ele estará assegurado pelo artigo 22, do CDC, a buscar, na justiça, a reparação dos danos causados.

Lembrando que, antes de comprar a passagem, leia atentamente as regras da companhia aérea. Se o consumidor tiver um problema, deve notificá-la. Se a situação não for resolvida pela empresa, é possível registrar uma reclamação administrativa na Anac, no Procon e no site consumidor.gov.br. A indenização e reparação de danos é solicitada através de processo judicial.

 

Fabricio Posocco é professor universitário e advogado no Posocco & Advogados Associados (www.posocco.com.br)

 




Os desafios e as perspectivas no Ministério da Justiça e Segurança Pública com a nomeação de Ricardo Lewandowski

 

Com a anunciada nomeação, recente, de Ricardo Lewandowski para o Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Brasil renova sua esperança quanto a um ponto nevrálgico e, também, estratégico. Muitas, afinal, são as expectativas sobre a forma como serão conduzidos os trabalhos na pasta com a nova gestão. Há demandas urgentes – algumas, históricas, e outras que necessitam, não de hoje, de um freio que impeça o avanço da criminalidade e da sensação de injustiça e de impunidade no País.

Sabe-se que o Estado Moderno, tal como foi idealizado pelos liberais, continha uma única garantia aos cidadãos: a Segurança Pública. Como se deu mais tarde, tal promessa era utópica, uma vez que, sem o reconhecimento dos Direitos Humanos, em nada a proposta estimulava os cidadãos a aderirem ao pacto social em tela

Um novo desenho foi apresentado, a partir da Constituição Federal de 1988 – o do Estado e da Sociedade do Bem-Estar Social. Nesta configuração, a sociedade torna-se corresponsável pela formulação de políticas sociais de apoio e de atenção a vítimas.

O mais novo ministro da Justiça e Segurança Pública chega para ocupar o posto ao passo em que se aguarda apoio governamental para a aprovação do Estatuto da Vítima (projeto de lei 3.890-2020), que conta, desde 2022, com pedido de urgência na Presidência da Câmara dos Deputados. Infelizmente, no entanto, não há, até o momento, previsão de apreciação de tal requerimento.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) já mostraram indicativos seguros ao Poder Legislativo quanto à necessidade de disponibilização à sociedade dessa ferramenta, por meio de resoluções e de campanhas de proteção integral dos direitos das vítimas.

Aliás, a sociedade mudou – e o mundo mudou, e muito, também! Não se está mais falando em contenção do poder do soberano frente aos súditos, mas, sim, em cidadãos plenos e mais conscientes de seus direitos e deveres em meio a um Estado Constitucional.

A criminalização da violência institucional é um indício do que digo – é impossível falarmos, por exemplo, em juízo de garantia com a balança pendente apenas para o lado daquele que praticou uma infração penal. É preciso encontrar o equilíbrio entre valores e interesses, no qual as penas e as medidas sejam céleres, justas, proporcionais, e, sobretudo, aplicadas com humanização para ambas as partes: autores de infrações penais e vítimas.

Outro tópico a ser enfrentado pelo mais novo ministro da Justiça e Segurança Pública tem a ver com a política resolutiva de acolhimento a refugiados. Fato é que, nada adianta abrir as portas do Brasil, se nada for feito para o reconhecimento da capacitação profissional desses indocumentados em seus países, com direito ao fornecimento de algo básico, como a tradução de documentos.

Igualmente importante é o fomento às práticas restaurativas, por meio de editais que respeitem a sua origem verdadeiramente social, evitando-se, assim, sua deturpação, via a aplicação de regras processuais que foram idealizadas para outro modelo de Estado de Direito.

Faz-se necessário, ainda, o investimento sério e seguro em políticas de segurança digital, com forte combate e prevenção a crimes praticados mediante fraude, e que, há muito, assolam o País.

Por outro lado, penso que o verdadeiro desafio de Ricardo Lewandowski seja interno. Reside na criação de um Gabinete, indiscutivelmente, ativo e democrático, bem como na escolha prudente de cada servidor que vai integrar o Ministério. É providencial que a estrutura seja ocupada por profissionais que, de fato, queiram fazer diferente, e que não se escondam por trás de burocracias inacessíveis aos movimentos sociais, ao cidadão comum e às instituições, como é o caso do Ministério Público (MP), do Poder Legislativo e do Poder Judiciário.

O Instituto Pró-Vítima parabeniza o novo ministro por sua escolha, lhe almeja uma profícua gestão e se coloca à disposição para contribuir com os novos capítulos da Justiça e da Segurança Pública do Brasil.

 

Celeste Leite dos Santos é doutora em Direito Civil, mestre em Direito Penal, promotora de Justiça em último grau no Ministério Público (MP) de São Paulo, presidente do Instituto Pró-Vitima, e idealizadora do Estatuto da Vítima, do Infovítimas Brasil, e da lei federal de Importunação Sexual.




Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa

A liberdade humana é o mais precioso dom que Deus nos deu, pois ela nos faz, acima de tudo, imagem e semelhança de Deus. Diz Santa Catarina de Sena nos  “Diálogos” que nem Deus e nem o demônio tiram a nossa liberdade; pois, sem ela, seríamos um robô, uma marionete, um teleguiado; e não um filho de Deus capaz de pensar e decidir livremente. Deus nos quis grandes e livres.

O Concílio Vaticano II, na “Dignitatis humanae”, disse: “Este Sínodo Vaticano declara que a pessoa humana tem direito à liberdade religiosa. Consiste tal liberdade no seguinte: os homens todos devem ser imunes da coação tanto por parte de pessoas particulares quanto de grupos sociais e de qualquer poder humano, de tal sorte que em assuntos religiosos ninguém seja obrigado a agir contra a própria consciência, nem se implica de agir de acordo com ela, em particular e em público, só ou associado a outrem, dentro dos devidos limites.  Além disso, declara que o direito à liberdade religiosa se funda realmente na própria dignidade da pessoa humana, como a conhecemos pela palavra revelada de Deus e pela própria razão natural. Este direito da pessoa humana à liberdade religiosa na organização jurídica da sociedade deve ser de tal forma reconhecido, que chegue a converter-se em direito civil” (n.2).

Deus permitiu que o pecado entrasse na história da humanidade, porque se Ele o impedisse, o homem não seria livre e belo. Mas Deus já tinha um plano para socorrer a humanidade: a Encarnação do Verbo e o Seu sacrifício na cruz.

A liberdade também deve ser respeitada na opção religiosa de cada um. Jesus mandou pregar o Evangelho a todas as nações, e fazer todos discípulos seus, mas não por coação, violência, chantagem, lavagem cerebral, etc., e com um convencimento pela razão, e por uma boa catequese que mostre os reais valores da fé e da religião, como sempre fizeram os santos.

Houve épocas no passado em que reis católicos, como o imperador Carlos Magno, impunham a fé aos pagãos, como aconteceu aos anglo-saxões no século VII, porque era a cultura da época, empregada por todos os povos. No Império Romano, por exemplo, o imperador era o Sumo Pontífice da religião pagã e impunha o paganismo a seus súditos. Isto aos poucos foi sendo mudado. Hoje não se admite mais isso: a fé deve ser proposta e não imposta.

A imposição religiosa, gerada pelo fanatismo religioso ou pelo fundamentalismo bíblico é nociva para o indivíduo e para a convivência em sociedade. Vemos o que acontece, por exemplo, com os terroristas do Hamas, Estado Islâmico, entre outros, que se propõem a matar em nome de Deus, como se isso fosse possível.

Hoje são milhões de cristãos perseguidos e assassinados, especialmente na África e na Ásia, pelo simples fato de serem cristãos. Em toda a história da Igreja, em toda a terra, milhares de mártires derramaram seu sangue onde o Evangelho foi pregado. Basta pensar nos mártires durante os regimes do comunismo, nazismo, nas revoluções dos Cristeros no México (1929) e na Guerra Civil Espanhola (1930), que gerou muitos mártires.

“Um cristão é assassinado a cada cinco minutos”, afirmou o conceituado sociólogo Massimo Introvigne na Conferência Internacional sobre Diálogo Inter-Religioso entre Cristãos, Judeus e Muçulmanos, realizada em Budapeste,  promovida pela presidência húngara da União Europeia. Isto significa que são 12 cristãos mortos por hora, 288 por dia, 8640 por mês e 103.680 por ano. Um absurdo!

Estas são algumas das tristes consequências da intolerância religiosa.

Professor Felipe Aquino é apresentador dos programas “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos” pela TV Canção Nova. Autor de mais de 100 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.