Diocese de Assis
Entender o conceito da riqueza sob a ótica da fé cristã exige, antes de tudo, optar pelas riquezas ocultas noutra dimensão, ou seja, no Reino celestial. Como acumular na terra os bens doutro mundo? Como acumular no céu os bens da terra? Essas questões se arrastam desde que o ser humano compreendeu ser impossível enriquecer uma vida deixando de lado a paz de espírito. Não há riqueza quando a alma atribulada dispensa a sabedoria do desapego e da boa administração. Essa requer um olhar responsável sobre a realidade dos bens e valores presentes na sociedade onde se atua.
Por exemplo, onde a pobreza menstrua… Isso mesmo: agora nossa pobreza está menstruando sem absorventes adequados, sem direito à dignidade pessoal, ao mínimo necessário para se estabelecer uma relação de igualdade ou fraternidade interpessoal. Aquele jovem cioso de seus deveres religiosos mostrou-se apegado demais aos poderes proporcionados pelos bens momentâneos que conseguiu amealhar. Titubeou em atender a uma necessidade mínima no desafio que lhe foi proposto: “Vai, vende tudo…” Lance fora as amarras que ainda prendem suas boas intenções, coloque em prática o que a sabedoria do espírito lhe aponta como certo, faça uso de seus poderes para bem gerir os bens que conquistaste, que lhe foram concedidos por honra e mérito, pois este é o único caminho do seguimento de uma fé pura e genuína. Só então poderá se dizer seguidor cristão.
Riqueza não é uma questão política, advinda do capitalismo apenas. É também uma questão pessoal. Há muitos pobres avarentos. Há muitos ricos paupérrimos. A dosagem entre riqueza e pobreza está na forma de se administrar uma e outra e não na medida pura e simples de posses e não posses. Antes, é preciso medir o grau das responsabilidades. Você é rico pela sabedoria de sua administração ou pelos golpes que sua ambição praticou? Você é pobre pelas circunstâncias de uma sociedade injusta, uma política antissocial ou pela inercia dos esforços pessoais e do comodismo?
Pior pobreza é aquela que corrói as riquezas espirituais. Aqui se compreende a impossibilidade de passar um camelo pelo crivo estreito da justiça divina, a “agulha” de Cristo. Nada passa em despercebido do olhar misericordioso de Deus. De nada valem as riquezas terrenas sem os méritos dos bens espirituais que guiam nosso comportamento moral e ético e impedem injustiças. Não existe riqueza justa onde a pobreza campeia. Essa afirmativa já foi muito criticada em contextualizações pastorais, mas não deixa de ter um fundo de verdade questionador, pois aponta uma ferida social que fere princípios cristãos. “Então, quem pode ser salvo?” Foi a pergunta feita a Cristo diante da complexidade de sua proposta de desapego e prioridades sociais. O bem-estar de todos estava acima do privilégio de poucos. Nada mudou, desde então.
Diante da realidade assustadora que assombra as relações humanas, com seus desníveis sociais e suas alternativas políticas sempre deficitárias de justiça, sejam em regimes totalitários ou democráticos, o olhar de Cristo continua a nos desafiar. A ótica terrena ainda valoriza riquezas palpáveis e amealháveis neste mundo. Conquanto, a ótica da fé cristã nos aponta para as riquezas intocáveis e perenes da realidade espiritual, o “mundo futuro, a vida eterna”. Questão de ponto de vista. Mas é bom não pagar pra ver.
WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]