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Diocese de Assis

 

Quem, nesta semana, viu a imagem de um Papa fragilizado, sendo quase carregado ao colo para se levantar de sua cátedra e depois utilizando-se de uma cadeira de rodas para se mobilizar, não imagina a força interior que move esse homem de Deus. Mesmo impossibilitado de uma locomoção natural, não desistiu de suas mobilizações em prol da Paz, em especial a preocupação que suscita a guerra Rússia-Ucrânia, estopim acesso de um possível terceiro conflito mundial. Papa Francisco, como pastor universal, tem se manifestado publicamente, expondo seu desejo de mediação e diálogo entre as partes.

“Falei com o patriarca Kirill, da Rússia, por 40 minutos, via zoom. Nos vinte primeiros minutos, com uma carta na mão, ele me leu todas as justificativas para a guerra. Eu escutei e disse a ele: eu não entendo nada disso. Meu irmão, não somos clérigos de estado, não podemos usar a linguagem da política, mas de Jesus. Somos pastores do mesmo povo santo de Deus. Para isso devemos buscar caminhos de paz, para acabar com o fogo das armas. O Patriarca não pode se transformar no coroinha de Putin” (Corriere della Serra, 03 de maio de 2022).

O profetismo dessas palavras chega aos nossos ouvidos na semana em que nosso calendário litúrgico nos apresenta a figura do Bom Pastor. “As minhas ovelhas escutam a minha voz, eu as conheço e elas me seguem” (Jo 10,27). Na verdade, a voz profética da Igreja possui a força demolidora contra a falsidade do jogo político, esse que é capaz de mascarar uma razão por certo tempo, mas nunca o tempo todo. As justificativas de Putin desmoronam dia a dia e o apoio político que pensava possuir cai por terra com a simplicidade das palavras de Francisco: “O Patriarca não pode se transformar no coroinha de Putin”. A Igreja Ortodoxa, até então manipulada e cerceada por falsas justificativas, percebe aos poucos o ridículo público a que se expõe. “Não podemos usar a linguagem da política, mas de Jesus”, alerta Francisco.

O episódio ilustra bem a força do pastoreio cristão. Não é um fato isolado, que as circunstâncias do momento nos apresentam, mas uma verdade que a fé nos ensina desde sempre: o povo de Deus conhece a voz que o conduz, conhece a verdade que tentam lhe ocultar, sabe bem que guerra alguma lhe trará a paz que almejam, a vida que sonham para seus filhos. Nada lhes roubará a fé e a esperança de um mundo novo, uma vida digna, um governo justo, uma terra de promissão maior e melhor do que aquela que a soberania terrena pensa dominar. “Meu Pai, que me deu estas ovelhas, é maior que todos e ninguém pode arrebatá-las da mão do Pai” (Jo 10,29).

Por maiores e mais horripilantes que sejam as consequências de uma guerra, jamais serão tão consoladoras quanto as palavras do Bom Pastor. Jesus continua sua ação libertadora neste mundo de trevas momentâneas, onde o jogo político do poder tenta mascarar a verdade que nos guia. A vida terrena é prenúncio da vida eterna. Como tal, devemos respeitá-la, promove-la em sua dignidade, conduzi-la sempre para os caminhos do aprisco do rebanho divino, onde Criador e criatura se tornam únicos, como “Eu e o Pai somos um”, como a verdade da nossa fé nos ensina. Francisco e Kirill conduzem rebanhos distintos, mas são pastores do mesmo povo santo de Deus, aquele que ainda caminha no deserto de nossas angústias e tribulações, sonhando com a Terra Prometida. Cuidado! Não sejamos coroinhas das nossas ambições terrenas. Só Jesus nos promete vida em abundância, eternidade em nossos sonhos de plenitude. Escutem a voz da verdade!

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]