1

Diocese de Assis

 

“Havia um homem que tinha uma doutrina, uma grande doutrina que levava no peito (junto ao peito, não dentro do peito), uma doutrina escrita que guardava no bolso interno de seu paletó. A doutrina cresceu e teve que colocá-la dentro de uma arca de cedro, uma arca como a do Antigo Testamento. A arca cresceu. E a arca de cedro engoliu o homem e a doutrina escrita que guardava no bolso interno de seu paletó. Veio outro homem e disse: ‘Aquele que tiver uma doutrina, que a coma, antes que o templo a coma; que a verta, que a dissolva em seu sangue, que a transforme em carne de seu corpo… e que seu corpo seja bolso, arca e templo’.”

Formado por Moisés, saído da infância com Davi e Salomão, o povo de Israel entrou na adolescência, fase irregular, indócil e inquieta, na qual Deus visa a educar através de seus profetas.

Eles, nossos longínquos antecessores do Antigo Testamento, nos ensinam quais são as dificuldades que se encontram quando se trata de educar um povo jovem, quando se procura formá-lo, para que responda com fé e generosidade aos chamados de Deus.

Os profetas se encontraram a braços com um trabalho muito árduo porque para a formação do povo, tinham que partir de um nível muito baixo, o qual condenavam em nome do Senhor: “O Senhor diz: ‘Visto que este povo com palavras fica perto e me honra com os lábios, mas o seu coração vai para longe de mim, e o culto que me prestam é obra de mandamentos humanos’…” (Is 29,13).

Tais censuras se dirigem contra aqueles que somente tributam um culto exterior, mas que não se aprofundam em sua fé. Na verdade, uma religião que se transmite como costume do passado ou se ensina como programa escolar, pode ficar facilmente na superfície, a um nível puramente externo.

Cristo mesmo referiu-se a esta situação de exterioridade, quando disse: “Este povo me honra com os lábios mas seu coração está longe de mim” (Mt 5,9).

A pedagogia dos profetas, anúncio da pedagogia de Cristo, visava a superar esta situação de exterioridade, através de um processo, pelo qual a lei ficasse gravada nos corações. Assim, dizia Jeremias em nome do Senhor: “Farei com Israel outra aliança. Porei minha lei em seu interior, inscrevê-la-ei em seus corações e serei seu Deus e eles serão meu povo”.

O profeta conhece o segredo da nova aliança, isto é, sabe que Deus transformará o homem interiormente. Jeremias sentiu a transformação que se deu nele, quando o Senhor o fez profeta. Descobriu, então, uma intimidade com Deus, totalmente diferente da religião feita puramente de práticas.

Encontramo-nos, dessa forma, diante de um esforço dos profetas, no sentido de fazer com que o povo passasse de uma religião de exterioridade para uma de interioridade, em que cada pessoa se sente comprometida, no mais profundo de seu ser. Ezequiel, o profeta que teve a ingrata missão de denunciar energicamente toda a amargura do pecado, apresenta-nos esta interiorização como uma transformação profunda:

“Dar-vos-ei um coração novo e porei em vós um espírito novo; arrancarei o coração de pedra das vossas carnes e dar-vos-ei um coração de carne” (Ez 36,26).

O movimento manifesto nesta pedagogia divina é um processo de interiorização progressiva. A pessoa vai passando de um estado de passividade ou de simples receptividade da mensagem, para uma vivência profunda e pessoal da mesma; de um controle externo, para um controle interior e espiritual, que influi em todos os aspectos de sua vida.

A interiorização é uma necessidade humana e seu processo é pra vida toda. 

(Fonte: CASTRO, Luiz Augusto. Deixar que o outro seja – equilíbrio na formação. São Paulo, Paulinas, 1986, p. 53-55

PE. EDIVALDO PEREIRA DOS SANTOS