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Diocese de Assis

 

Por causa da dureza do coração humano, Moisés tolerou que o divórcio conjugal fosse aceito pelos israelitas. Essa tolerância ia contra os mandamentos que ele próprio havia promulgado naquela travessia de longos anos. Jesus, o novo Moisés, aquele que não veio abolir a lei, “mas levá-la à perfeição”, ratifica: “Quem repudia sua mulher e se casa com outra, comete adultério contra a primeira” (Mc 10,11). E vice e versa. Antes, reafirmou: “já não são dois, mas uma só carne. Não separe, pois, o homem, o que Deus uniu”.

Estão aí as mais objetivas palavras a favor da indissolubilidade da vida conjugal. Para muitos – talvez grande maioria – são essas prerrogativas cristãs um grande empecilho para a adesão e o seguimento incondicional ao mestre nazareno. Diria até ser este o motivo maior que impede um crescimento exponencial do cristianismo no mundo, nos dias de hoje. A vida dissoluta e prazerosa de muitos não combina com um compromisso de fidelidade, em especial quando esse compromisso diz respeito à vida a dois, à instituição familiar. E fidelidade é questão de observância à lei, de respeito à sua sacralidade. E sagrado é o caminho da santidade, da fidelidade também a Deus.

Assusta-nos essa tomada de consciência, que aponta nossa infidelidade não apenas ao cônjuge traído ou repudiado, mas igualmente a Deus. Se houve total adesão à vontade divina, se a bênção nupcial recebida foi algo divino, fruto de seu plano de amor, projeto de vida familiar e conjugal, então não se corta ao meio aquilo que “Deus uniu”. Eis a questão. Houve ou não o dedo de Deus naquela vida a dois? Foi Deus ou a volúpia carnal que os fez “marido e mulher”? Como diferenciar o fato do ato, a união plena e real de uma atração e ilusão momentâneas? Para diagnosticar essa verdade existem os tribunais da Igreja, que atestam ou não uma validade sacramental. Mas o fato primeiro é que não nos cabe aqui qualquer julgamento. Essa questão só Deus pode julgar.

A lição maior desse posicionamento radical de Jesus está no peso da lei de Deus. Não à toa a denominamos Lei do Amor. Nela residem todos os elementos da autenticidade, da fidelidade, da tolerância e do diálogo que caracterizam uma união plena e perfeita aos olhos de Deus. Assim como na pureza e no amor infantil, que circundam os passos de Jesus com alegria e simplicidade, “porque o Reino de Deus é dos que são como elas” (Mc 10,14). Ou seja, ninguém conserva um relacionamento perfeito, de amor pleno e duradouro, se não possuir a autenticidade de uma criança diante de Deus. Porque ela confia na proteção divina. Porque ela se submete aos seus ensinamentos. Porque ela não se deixa levar pelos turbilhões da maldade e do desamor. Antes, procura estar sempre próxima e moldar-se à perfeição dos mandamentos que a fé, só a fé, as ensina a praticar.

Tornar-se uma só carne é o ápice da vida conjugal perfeita. É sentir o que o outro sente, sonhar o que o outro sonha, viver o que o outro vive. Para quem vive ou viveu uma paixão verdadeira, sabe perfeitamente quão real são essas afirmativas. Assumir, pois, o tecido da unidade plena e total numa vida a dois não é acreditar em contos de fadas ou ilusões adolescentes. É repetir diuturnamente para o amado ou a amada, o mesmo que Adão exclamou ao acordar de um sono profundo e contemplar a beleza de sua amada: “Desta vez, sim, é osso dos meus ossos e carne da minha carne”! (Gn 2,23).

WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]