Diocese de Assis
Uma das contradições que mais afugenta fiéis da fé cristã é a vida abastada e a avareza sem freios de alguns pastores ou sacerdotes. Tanto no catolicismo quanto no protestantismo, esse contratestemunho evangélico é uma grande pedra de tropeço para a obra de Jesus, que não tinha sequer onde repousar a cabeça. Mesmo assim, é fácil constatar que o problema é maior do que se imagina, pois são muitos os clérigos que fazem de suas opções vocacionais um meio de vida cercado por privilégios e bem-estar acima da média dos pobres fiéis, o rebanho que pensam dirigir.
Há, sim, aqueles cegos guiando outros cegos, como ensinou Jesus em parábolas sobre os valores do seu Reino. Assim se compreende o “crescimento” – numérico em todos os sentidos – de certas correntes evangélicas, cuja pregação exacerba a prosperidade material como sinal de bênçãos celestiais. Dessa forma não se envergonham em apresentar seus líderes como exemplos primeiros dessa vitória terrena – e não poderia ser de outra forma – para que mais pessoas se somem a eles ou pelo menos se tornem os sustentáculos dessa mágica em nada abençoada, mas contraditória e maligna por excelência. Ai destes que assim procedem!
Preocupado com essa situação – que também acontece entre os católicos – o Papa Francisco deu-nos o alerta em entrevista a uma emissora de TV portuguesa. Falando com o repórter Henrique Cymerman, foi objetivo e duro: “As formas de escândalos dos pastores ricos são conhecidas de todos nós. O povo de Deus pode perdoar a um pastor, a um padre, a um bispo ou o que seja se tiver um caso amoroso. Nesse caso perdoa. Se tiver bebido um pouco mais de vinho, perdoa. Nunca perdoará que ande a sacar dinheiro ou que trate mal as pessoas. É curioso como o povo tem olfato… em relação ao que Deus pede de um pastor”.
Verdade nua e crua: o povo conhece os pastores que tem, assim como é verdadeira a recíproca, a ciência do bom pastor. Então todos se merecem! Cada povo tem o pastor que pensa merecer… Aqui mora o perigo. Quando uma situação de injustiça é alimentada comunitariamente, não será apenas sua liderança passiva de prestar contas diante de Deus, mas a comunidade toda. Portanto, comunidade que se preocupa em demasia com seus bens e posses materiais, que constrói para si uma imagem de prosperidade estritamente materialista, que busca sucesso e crescimento na base das aparências e do crescimento social, político ou econômico apenas, não é e nunca poderá ser denominada cristã.
Ao contrário, o sucesso da doutrina cristã vem da simplicidade de seu mestre. Nem bolsa, nem alforje, recomendava Jesus aos discípulos. Nem ouro, nem prata, lembrava Pedro, “na porta do templo, chamada Formosa”, operando em seguida o milagre – única riqueza que a Igreja pode oferecer à miséria humana: “o que tenho te dou, em nome de Jesus Cristo, o nazareno, levanta-te e anda” (At 3, 6). Esse é o segredo da prosperidade cristã, a única riqueza que se espera dum bom pastor em seu ofício. Esse é o entendimento pleno da cura que se espera do ministério da Igreja, no mundo: levar a todos, ricos e pobres, cegos, coxos e paralisados, ao entendimento do que seja nossa maior riqueza nessa vida, a plenitude desta. Portanto, levanta-te e anda!
Ora, se o centro da pregação cristã nos remete para a vida espiritual, aqui, agora e além desta, nada há de coerência na vida de um evangelizador amante do dinheiro e do bem-estar. Nem na doutrina que ensina. Nem na igreja que o mantêm. Completa o papa: “Creio que Jesus quer, o Evangelho quer que nós, os bispos, não sejamos príncipes, mas servidores”. Da mesma forma, creio que qualquer cristão, antes de cobrar privilégios, riquezas estritamente materiais, deve olhar para a própria insignificância e concluir: Sem Deus, sou nada! Mas a única riqueza da Igreja somos nós.
WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]