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Disrupção e colaboração: lições do Vale do Silício para a Educação

A cultura das relações horizontais, diversas e acessíveis, representada pela naturalidade do jeito californiano, reflete-se na gestão das instituições nessa reconhecida parte da Costa Oeste norte-americana, onde há preferência por hábitos simples e informais nos ambientes de trabalho, estimulando a criatividade e a produtividade.

Vale do Silício, definição encontrada pela primeira vez em uma publicação em 1971, compreende uma região de cidades pequenas situadas entre as referências San Francisco e San Jose. Foi a produção de hardware que rendeu o apelido de Vale do Silício: o chip de silício foi o primeiro insumo para a indústria de computador, e as placas de computadores do mundo inteiro eram produzidas ali – por isso, esse espaço aglutinou inúmeras empresas do ramo tecnológico.

Com o passar dos anos, a tecnologia na região foi se transformando em apenas uma commodity – o diferencial, de fato, são as pessoas. O segredo da inovação está na capacidade das pessoas de pensar e agir de forma colaborativa, empreendedora, audaciosa e escalável.

E aqui já salta aos olhos a primeira lição que as instituições escolares podem aprender: inspirar-se no desenvolvimento tecnológico, mas, principalmente, investir na forma de pensar do Vale. Nosso sistema de gestão escolar, em sua maioria, é linear, burocrático, remoto e limita as criações, o que difere muito de tudo que é fomentado na região, cujo ambiente proporciona estímulos para raciocinar e produzir a partir desse raciocínio. Não existe o medo de errar. O mercado regula o erro, consumindo ou não os produtos desenvolvidos. E os erros não desmotivam ninguém – pelo contrário, servem de base para o próximo acerto. Surge então mais uma evidente lição: aceitar o erro como parte do processo, desafio quase unânime na educação. 

O modo mental do Vale muito se define – e se difere de tantos outros – pela paciência em gerar algo raro, que mude a vida de alguém e que, majoritariamente, facilite os hábitos de vida das pessoas. O objetivo não é ganhar dinheiro propriamente. É fazer dinheiro com a prerrogativa de que um espírito colaborativo vale mais do que qualquer relação hierárquica e verticalizada. Tem que ir além. 

Quanto aprendizado em um único mindset! Paciência e propósito. A escola já não tem mais tempo para aguardar seus alunos se desenvolverem no tempo adequado, já não pode mais esperar o professor explorar todas as possibilidades que um assunto pode trazer, muito menos dar a cada um o diferente tempo que ele necessita. Há uma pressa institucionalizada: aqueles que concluem antes são melhores, mais desenvolvidos e diferenciados. O propósito é imediato, pois não se pode ter nada no ambiente escolar que não seja de uso instantâneo, sob pena de ser prontamente descartado. 

E o Vale do Silício não é reconhecido mundialmente por sua posição avançada em tecnologia? Não estaria somente aí um aprendizado para as escolas? Sim, de fato, há por lá muitos robôs que fazem pizza, que servem café, que entregam comida, pesquisadores que trabalham com inteligência artificial projetando um futuro em que nossos cérebros poderão ser inseridos em máquinas, empreendedores que estão desenvolvendo impressora de tecidos orgânicos, entre tantos outros exemplos. Mas apenas carregar todo esse aparato para a escola não resolveria a questão, pois é preciso estimular soft skills, como a habilidade de inovação, a criatividade, a liderança e a tomada de decisão. 

No Vale, as pessoas conversam, convergem, divergem e se questionam. O mindset local colabora para a autoavaliação e avaliação de quem está ao redor a ponto de se sentirem à vontade para apontar impasses, propor melhorias e até mesmo conceber novas formas de se relacionar em equipe. Além disso, em um ambiente inovador não há espaço para o medo de se expressar. 

E isso tudo pode ser ensinado? Pode e deve. Este é o grande desafio da educação contemporânea: inserir metodologias de ensino que desenvolvam aspectos emocionais da pessoa, pois, em performance, um robô certamente terá vantagens. O que o ser humano vai ter como diferencial competitivo será a capacidade de resiliência, a tolerância ao erro, o processo de liderança, a competência de negociação. Uma máquina só negocia com o que está lançado no sistema, o ser humano tem a sensibilidade e capacidade de ir além disso, de ampliar possibilidades. 

Ilude-se quem acredita que essa trajetória é fácil ou que se encontrou um oásis de empregabilidade e oportunidades. A competição está muito presente no Vale. No entanto, associado a um lugar competitivo está um lugar colaborativo onde pessoas acreditam em pessoas e na capacidade de potenciar uma boa ideia que as interações humanas podem incentivar. Exatamente o ecossistema que a escola poderia ter… 

 

Milena Fiuza, gerente pedagógica Sistema Positivo de Ensino