1

Espaço Espírita

 

 

 

  Joaquim Peixoto desencarnara vítima de varíola hemorrágica.  Sofrera muito. Acabara sangrando e com febre alta.  De todos os acometidos, na cidade, tinha sido o único que sucumbira.

Agora, após as orações da noite, José Lourenço, o amigo de infância, recordava os acontecimentos daquele dia triste.  O desconsolo da pobre viúva…  As lágrimas dos filhinhos órfãos…

Debatia consigo mesmo o ocorrido.  Como espírita, compreendia muitas coisas.  Entretanto, Joaquim era moço e partira cedo demais.  Vivia bem com a família, visitava os necessitados e socorria os enfermos.  Não se ligara a religião nenhuma, contudo, era extremamente caridoso.

Não entendia por que o amigo desencarnara assim, com tamanho tormento.

E, embalado por pensamentos e recordações, adormeceu, vendo-se em paisagem completamente desconhecida.

Século XIX: a casa grande, a senzala, os escravos.  Na praça de grande fazenda o escravo gemia, atado ao mastro das punições.  Banhava-se em sangue, a fluir de várias perfurações por todo o corpo.  A cada ordem do senhor, o punhal entrava novamente na carne castigada.  O rosto e os braços.  O tronco e as pernas.  Tudo dilacerado.

Diante dele, o senhor de engenho gargalhava e dizia:

Pagarás pela fuga.  Morrerás lentamente.  Servirás de exemplo aos demais, para que obedeçam.

Aterrorizado pela cena, José Lourenço reconheceu no fazendeiro o rosto do amigo desencarnado.

Acordou assustado ainda.  O suor brotava-lhe na fronte.  Compreendera a revelação que a Providência Divina lhe fazia.

A varíola resgatara o débito enorme de Joaquim Peixoto.

HILÁRIO  SILVA

 Extraído do livro “Histórias da Vida”

Psicografia: Antonio Baduy Filho – Editora IDE

U.S.E.-UNIÃO  DAS  SOCIEDADES  ESPÍRITAS  DO  ESTADO  DE  SÃO  PAULO – INTERMUNICIPAL  DE  ASSIS