Jurídico: vilão ou aliado da área de negócios?

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“Está com o meu Jurídico”. “O Jurídico mexeu no documento”. “Meu Jurídico não autorizou seguir” … Certamente você já ouviu (ou falou) essas e outras frases de cunho semelhante, em diversos tipos de situações. Porém, o que passa desapercebido para muitas pessoas é que quando o Jurídico faz suas colocações ou até mesmo dá uma recomendação mais incisiva, na verdade ele está trabalhando junto à área de negócios e não contra ela.

Para entender se o Jurídico é, de fato, um vilão ou um aliado, precisamos conhecer brevemente a trajetória do direito e da advocacia no Brasil. Nossa primeira Constituição Federal vai completar 200 anos em 2024 e muitos de nossos Códigos também tiveram sua primeira versão em séculos passados. Assim, não é exagero dizer que a advocacia existe no país há séculos, tendo enraizada, inevitavelmente, algumas características mais conservadoras. Feita esta breve contextualização, retornemos aos dias atuais.

Hoje em dia, quando um cliente (interno ou externo) demanda o apoio do Jurídico, ele não busca somente se resguardar de eventuais futuros problemas, ele espera mais do que isso. O cliente busca um aconselhamento jurídico, alguém que lhe oriente sobre qual a melhor forma de atingir seu objetivo, dentro da lei, assegurando seus direitos e garantindo que seus deveres sejam exigidos na extensão do necessário.

O advogado do século XXI não pode ser aquele que simplesmente “caneta o contrato” e diz ao seu cliente que não dá para seguir como proposto. Além das recomendações jurídicas, o advogado deve entender o negócio como um todo, possuir visibilidade geral da operação para então poder recomendar seu cliente assertivamente. O Jurídico hoje deve ser visto como um parceiro do negócio e não (mais) como uma área que simplesmente gera custos e atrapalha a concretização de operações.

De alguns anos para cá, as empresas vêm se conscientizando de que o advogado é alguém que aconselha, que caminha lado a lado, e não somente aquele que você aciona quando tem um problema concreto. É certo que em muitas vezes o papel do advogado é, de fato, remediar determinada situação, mas, ainda assim, quando se é parceiro do negócio, é possível orientar o cliente e encontrar a solução mais benéfica, ainda que em um cenário adverso.

A importância do Jurídico enquanto conselheiro – seja na posição de um advogado generalista consultivo ou através da atuação de um advogado contencioso estratégico – tem crescido no Brasil e muitas empresas passaram a abrir headcounts que antes inexistiam para a criação de uma cadeira (quando não uma estrutura) jurídica dentro das corporações.

Isto porque, pouco a pouco – lembre-se que a advocacia existe há praticamente dois séculos no país e o estigma do “juridiquês” e a cultura do aconselhamento jurídico ainda pesam – as empresas têm finalmente entendido que vale investir em um aconselhamento prévio, capaz de enxergar a operação de uma forma macro, do que depois ter que se socorrer a um suporte inevitável (e na maior parte das vezes mais caro) para gerenciar contingências.

Se o Jurídico for visto realmente como um parceiro do negócio, ele será capaz de realizar seu trabalho de forma mais abrangente, de recomendar sem impedir, de aconselhar sem vedar, mas, acima de tudo, de entender o objetivo da empresa em determinada operação e avaliar quanto ela é importante para o seu crescimento, compreendendo as horas de trabalho depositadas para tirar um projeto do papel e a importância de contribuir para sua construção.

Quando o advogado é integrado ao time do negócio, aconselhando-o e fazendo considerações desde o início, o resultado tende a ser mais efetivo. Os possíveis problemas que poderiam surgir lá na frente muitas vezes são mitigados no início, pois pode ser criado um planejamento para o enfrentamento de situações adversas.

Assim, à medida que o Jurídico conquista a posição de uma área estratégica, participando ativamente da tomada de decisões, seu papel acaba por transcender o aconselhamento jurídico, passando a englobar, muitas vezes, temas relacionados à Governança Corporativa e Compliance, proporcionando às empresas uma atuação ainda mais ampla, auxiliando na observância das diretrizes internas, trabalhando em conjunto com outras áreas.

Ao ter reconhecida a sua importância, o Jurídico deixa de ser visto como um vilão e passa a ser um aliado efetivo do negócio, onde todas as áreas saem ganhando.

Priscilla Perez Bastos, da TMB Advogados

Foto: Celso de Me

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