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Namoro moderno

Estive matutando. Não existem mais declarações de amor como antigamente. Naquele tempo pegar na mão da namorada no escurinho do cinema era o máximo. A gente levava para casa a fragrância do perfume dela. Durante a noite ficava sonhando acordado. O fato de pegar na mão já mexia com nossas emoções. Antes do cinema, o flerte na praça da matriz, era a prova evidente de  que algo mais que uma simples amizade estava pintando. No nosso imaginário, uma simples troca de olhar, um sorriso, já implicava numa gostosa cumplicidade de afeto, a ponto de deixar o cara um tanto quanto biruta de tão apaixonado.   Mão boba? Nem pensar. Seria o fim do namoro.

Hoje, esse encantamento ruiu. O pessoal prefere agir rápido e rasteiro. Literalmente rasteiro. O Cupido que atirava setas nos corações apaixonados naquele tempo, hoje sequer tem tempo de colocar a flecha no arco. Inventaram novas formas de declarações de amor. De vez em quando encontramos no metrô, nas ruas, casais grudados pelos lábios, fazendo respiração boca a boca. Se fosse na praia, daria para imaginar que um dos dois estava se afogando. Surgiram também declarações  de amor aeroviárias, ou através de faixas escritas e  colocadas nos postes.

Um dia destes, eu estava na praia, quando passou um avião teco-teco voando com uma faixa estendida: “Bia, eu te adoro. Feliz aniversário. Do Pepe”. O evento aeronáutico noticiava que um certo Pepe endoidara de vez. Tudo  por amor a uma tal de Bia. Outro dia, ao acordar, percebi  que as leis e  posturas municipais foram transgredidas em nome da paixão. Avistei do alto da minha janela no décimo quinto  andar, defronte do meu prédio, uma faixa estendida entre duas palmeiras, com a encantadora declaração: “Juan, você  é tudo para mim, eu te adoro. Da sua eterna Lili”. O amor entre os dois deveria ser tão grande, que nem perceberam que a faixa foi afixada perto de outra, na palmeira ao lado, anunciando animal perdido. “Desapareceu uma cadela bassê, cor cinza com uma pinta preta entre os olhos. Atende pelo nome de Mimosa. Quem encontrar a Mimosa ligar para  3345… Gente, o amor é cego!…

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                       (Alcindo Garcia é Jornalista) e-mail: [email protected]