Cem Anos de Solidão, obra central do movimento literário conhecido como “boom latino-americano”, tem gerado novas expectativas acerca de sua adaptação para uma série que será lançada na plataforma de streaming Netflix, em dezembro deste ano. Escrito pelo colombiano Gabriel García Márquez e publicado em 1967, o livro icônico do realismo mágico e da literatura mundial tardou a ser adaptado para a linguagem cinematográfica por resistência do próprio autor, falecido em 2014. Agora, com a proximidade do lançamento da série e com a inclusão da obra na lista de leituras obrigatórias de concursos e vestibulares, Cem Anos de Solidão volta a ter o holofote que sempre mereceu.
A narrativa, vencedora do Prêmio Nobel de Literatura em 1982, acompanha a saga da família Buendía ao longo de sete gerações, na pequena comunidade fictícia de Macondo – que, por si só, já é um personagem. Os temas centrais incluem, evidentemente, a solidão, a busca por identidade, os vínculos interpessoais e os ciclos da história, que tendem a se repetir. A solidão permeia a vida dos Buendía, revelando a complexidade das relações humanas. Incesto, loucura, lutas e mortes também são retratados na narrativa.
Para dar conta de tudo isso, García Márquez utiliza uma prosa poética e descritiva, criando imagens vívidas que transportam o leitor para o universo de Macondo. Ali, o realismo mágico transforma eventos extraordinários como parte do cotidiano. Em determinado ponto da história, por exemplo, chove quatro anos sem parar, a ponto de peixes entrarem nadando pela janela e todos acharem normal. A chuva constante desencadeia outras tantas situações atípicas, como o cheiro de umidade e a cor esverdeada dos habitantes. Essa técnica literária cria um ambiente em que o fantástico e o real coexistem, levando o leitor a refletir sobre a natureza da realidade.
Macondo é uma cidade-personagem que não existe, mas que poderia ser a representação de muitas cidadezinhas da América Latina: simboliza tanto a esperança quanto a decadência. Sua fundação e crescimento refletem as transformações sociais da América Latina, enquanto sua eventual destruição sugere a inevitabilidade do destino e a repetição dos erros do passado. Além do lugar, os demais personagens são cativantes e instigantes e, entre nomes que se repetem (são muitos Aurelianos e Josés Arcádios), vale mencionar a matriarca, Úrsula Iguarán, que esteve presente e ativa no seio familiar ao longo de seis gerações.
Cem Anos de Solidão não apenas influenciou a literatura latino-americana, mas também se tornou uma referência global, já que explora a condição humana de maneira local, ecoando em reflexões que alcançam diferentes realidades, espaços geográficos e épocas. A leitura desse clássico é fundamental para qualquer pessoa que ame uma história envolvente, intensa, cheia de reviravoltas e reflexões.
*Professora de Literatura do Colégio Marista Assunção, mestre e doutoranda em Linguística Aplicada pela UFRGS |