JEJUM DE PALAVRAS
Diocese de Assis
Primeiramente, necessito explicar o que seja um jejum, já que palavras com atributos religiosos, nos dias de hoje, soam estranhamente aos ouvidos de grande maioria. Sim, exercícios espirituais perderam sentido numa sociedade extremamente alheia a muitas das questões de fé. Jejuar ou abster-se são verbos desprovidos de significado num mundo onde consumir e enfastiar-se é a prioridade social. Como então compreender uma atitude de renúncia diante do muito que o mundo nos oferece?
Essa é a primeira questão. Fora da disciplina religiosa, jejum nada significa. A não ser nas falidas e horrorosas práticas de dieta alimentar, diante da explosão de banhas e gorduras que seu excesso proporcionou. Mesmo assim, essa questão estética já quase não possui adeptos, pois outras fórmulas milagrosas e até radicais fazem mais sucesso que o santo e inofensivo jejum. Fechar a boca é imoral; então que se reduza o estômago! Perco um pouco de uma digestão sadia, mas nada perco do prazer de degustar, consumir, consumir, consumir. Assim mantenho a boca livre, a língua solta…
Há aqui uma associação não só de aspecto físico e nutricional, mas igualmente de aspecto moral, religioso. O fausto alimentar, muitas vezes, denuncia subnutrição espiritual. Um complementa o outro. Quem possui alto índice de saúde espiritual raramente prioriza seus hábitos alimentares como essenciais à saúde física. Epa, calma! Não estou aqui a dizer que nossos gordinhos não possuam vida espiritual sadia ou vice versa. O que digo é que o equilíbrio entre uma energia e outra, entre o ser espiritual que habita em nós e a vida biológica que ocupamos necessitam de hábitos saudáveis. Dentre estes, o jejum. Mas “nem só de pão vive o homem – ensinou o mestre cristão – mas de toda a palavra que sai de seu coração”. Eis aqui o grande princípio do jejum pleno, perfeito! Jejuar também na contingência de nosso palavreado solto, irresponsável, sem freios, sem limites. Jesus, em sua sabedoria divina, nos mostra o quanto destruímos com nossos hábitos que saciam muito mais as discórdias de nossos corações, do que o vazio de nossos estômagos.
O jejum verdadeiro não é uma simples abstinência, uma renúncia momentânea, mas uma prática saudável de aprimoramento tanto espiritual quanto físico. Às vezes é mais fácil renunciar a um hábito de consumo do que a um vício que afete a espiritualidade. Deixar de lado um vício torna-se uma prática benéfica à vida, física e espiritualmente falando. Dai que jejum não é um ato de penitência quaresmal que diz respeito apenas ao seguidor deste ou daquele preceito religioso, pois que a renúncia, por si, é um gesto constante no exercício de fé. Jejuar também é uma disciplina de aprimoramento humano, pois que nos impõe limites e condiciona nossos hábitos.
Entretanto, a fé cristã nos pede mais, sobretudo, discrição em sua prática. Ou seja: “quando jejuardes –assim como quando orardes- não fiques triste”, mas disfarça ao máximo essa sua prática para que só você se beneficie dela. Em especial, a penitência que fazemos com a prática do jejum nos aproxima mais de Deus, que se agrada diante de um coração penitente. Sobretudo, façamos um exercício de “jejum de palavras”, estas que ponderam e justificam todas nossas ações e condenam ou sentenciam qualquer ação daqueles que pensam diferentemente de nós. Desse jejum estamos carentes!
20 anos de Palavras de Esperança. Publicado em 28 de março de 2017.
WAGNER PEDRO MENEZES [email protected]